A tecnologia futurista para levar a humanidade em uma viagem interestelar
Cientistas e engenheiros vêm se esforçando muito para conceber tecnologias futuristas que permitam viajar quase à velocidade da luz. Vai demorar muitos séculos para os humanos realizarem qualquer uma dessas ideias, eu acho. Mas elas me convencem de que civilizações ultra-avançadas provavelmente viajarão entre as estrelas a um décimo da velocidade da luz – ou mais rápido.
Abaixo, seguem três exemplos bem intrigantes de propulsão quase à velocidade da luz.
Este post foi extraído do livro A Ciência do Interestelar, escrito por Kip Thorne.
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Fusão termonuclear
A fusão termonuclear é a mais convencional das três ideias. A pesquisa e desenvolvimento para criar usinas de fusão controlada na Terra começou nos anos 1950, e um sucesso total não virá antes de 2050. Um século inteiro de P&D! Isso mostra, de forma realista, como as dificuldades são grandes.
E o que usinas de fusão em 2050 significam para espaçonaves movidas a fusão? Os designs mais práticos podem atingir 350.000 km/h, e possivelmente 1.000.000 km/h até o final deste século. Será necessária uma abordagem totalmente nova para aproveitar a fusão e chegar perto da velocidade da luz.
Um cálculo simples mostra as possibilidades da fusão. Quando dois átomos de deutério (hidrogênio pesado) são fundidos para formar um átomo de hélio, 0,0064 da sua massa restante (quase 1%) é convertida em energia. Se tudo isso for transformado em energia cinética (movimento) no átomo de hélio, ele se moveria a cerca de um décimo da velocidade da luz, ou 100.000.000 km/h.
Isto sugere que, se pudéssemos converter toda a energia de fusão no combustível de deutério em movimento numa nave espacial, ela poderia atingir uma velocidade de cerca de 1/10 da velocidade da luz – um pouco mais, se formos espertos.
Imagem por University of Washington/MSNW
Em 1968, Freeman Dyson, um físico brilhante por quem tenho grande respeito, descreveu e analisou um sistema de propulsão simples que, nas mãos de uma civilização suficientemente avançada, poderia conseguir isso.
Nesse sistema, bombas termonucleares (“bombas de hidrogênio”) são detonadas logo atrás de um amortecedor hemisférico de 20 km de diâmetro. Os detritos da bomba empurram a nave para a frente e ela consegue, na estimativa mais otimista de Dyson, chegar a 1/30 da velocidade da luz (ou 36.000.000 km/h). Um projeto mais complexo poderia se sair um pouco melhor.
Em 1968, Dyson estimou que um sistema de propulsão desses só seria possível no final de século XXII, 150 anos a partir de agora. Eu acho que isso ainda é muito otimista.
Raio laser e vela solar
Em 1962, Robert Forward – outro físico que respeito muito – escreveu um pequeno artigo em uma revista popular sobre uma nave espacial com vela, empurrada por um feixe de laser focado e distante. Em um artigo técnico de 1984, ele deixou este conceito mais sofisticado e preciso.
Um conjunto de lasers movidos a energia solar no espaço ou na Lua gera um feixe de laser com 7,2 terawatts de energia. (Isso é cerca de 20 vezes o consumo anual de energia do Brasil, ou o dobro do consumo anual nos EUA.) Este feixe é focado por uma lente Fresnel com 1.000 km de diâmetro.
Imagem por NASA/Marshall Space Flight Center via Wikipédia
Ele é focado em uma vela distante, com 100 km de diâmetro e pesando cerca de 1.000 toneladas, que está ligada a uma sonda de massa menor. (A direção do feixe deve ser precisa em quase quatro milionésimos de grau.) A leve pressão do feixe empurra a vela e a nave espacial a cerca de 1/5 da velocidade da luz, no meio de uma viagem de quarenta anos à estrela anã Proxima Centauri.
Uma modificação desse esquema então diminui a velocidade da nave durante a segunda metade da viagem, para que ela chegue ao seu destino com uma velocidade baixa o suficiente para pousar em um planeta.
Forward, assim como Dyson, imaginou que sua ideia seria possível no século XXII. Olhando para os desafios técnicos, acho que isso deve demorar mais tempo.
Estilingue gravitacional em um buraco negro binário
Meu terceiro exemplo é uma variação própria – e ambiciosa – de uma ideia de Dyson (1963).
Suponha que você queira voar bem longe no universo – não apenas uma viagem interestelar, mas uma viagem intergaláctica – próximo à velocidade da luz, em poucos anos de sua própria vida. Você pode fazer isso com a ajuda de dois buracos negros orbitando um ao outro: um buraco negro binário. Eles devem estar em uma órbita altamente elíptica e devem ser grandes o suficiente para que suas forças de maré não destruam sua nave.
Usando combustível químico ou nuclear, você leva sua nave em uma órbita que se aproxima de um dos buracos negros. Sua nave então gira em torno do buraco negro algumas vezes, e depois – quando ele estiver indo quase diretamente em direção ao outro – a nave se afasta, cruza para o outro buraco negro, e gira em torno dele.
Se os dois buracos ainda estiverem indo um para o outro, o giro é rápido: você volta a orbitar o primeiro buraco. Caso contrário, o giro é muito maior; você precisa esperar até que eles se aproximem, para então voltar a orbitar o primeiro buraco.
Dessa forma, sempre viajando entre um buraco negro e outro, sua nave é impulsionada a velocidades cada vez mais altas, aproximando-se o mais perto que você quiser da velocidade da luz, se o buraco negro binário for suficientemente elíptico.
Para controlar quanto tempo você demora em torno de cada buraco negro, só é necessária uma pequena quantidade de combustível de foguete – isso é notável. É essencial navegar na órbita crítica do buraco negro, e lá fazer seu giro controlado. Mas digamos que esta é uma órbita altamente instável.
É mais ou menos como andar de moto na borda plana de um vulcão. Se você mantiver o equilíbrio, pode ficar na borda o quanto quiser. Quando desejar sair, uma ligeira virada da roda dianteira fará você descer pela montanha do vulcão. Da mesma forma, quando você quiser sair da órbita crítica ao redor do buraco negro, um ligeiro impulso do foguete permitirá que as forças centrífugas enviem sua nave para o outro buraco negro.
Quando você estiver perto da velocidade da luz, pode sair da órbita crítica em direção a seu alvo – uma galáxia no Universo distante. Mas aí você precisa encontrar outro buraco negro binário para fazer o processo inverso e reduzir sua velocidade…
A viagem pode ser longa, com uma distância de até 10 bilhões de anos-luz. Mas quando você se move quase à velocidade da luz, o tempo flui mais lentamente do que na Terra. Estando perto o suficiente da velocidade da luz, você pode chegar ao seu alvo em poucos anos. Isso, claro se você encontrar um buraco negro binário!
Você pode voltar para casa com o mesmo método. Mas o seu regresso pode não ser agradável. Bilhões de anos terão passado em casa, mas você terá envelhecido apenas alguns anos. Imagine o que você vai encontrar.
Este tipo de estilingue poderia fornecer um meio de difundir uma civilização através dos grandes confins do espaço intergaláctico. O principal obstáculo (que talvez seja intransponível!) é encontrar – ou criar – os buracos negros binários. Os buracos negros de lançamento podem não ser um problema para uma civilização suficientemente avançada, mas o binário para reduzir a velocidade é outro assunto.
O que acontece com você se não houver um binário para reduzir a velocidade, ou se você encontrar um deles mas errar o alvo? Esta é uma pergunta complicada, por causa da expansão do universo.
Estes três sistemas de propulsão podem parecer emocionantes, mas estão realmente em um futuro longínquo. Usando tecnologia do século XXI, precisamos de milhares de anos para chegar a outros sistemas solares. A única esperança para uma viagem interestelar rápida, no caso de um desastre terrestre, é um buraco de minhoca – assim como no filme Interestelar – ou alguma outra forma extrema para dobrar o espaço-tempo.
Adaptado de The Science of Interstellar, por Kip Thorne. Copyright © 2014 por Kip Thorne. Com a permissão da editora WW Norton & Company, Inc. Todos os direitos reservados.