O gelo do Ártico está levando muito mais tempo para se recuperar
Depois de encolher a níveis excepcionais no verão, a camada de gelo do Ártico está finalmente começando a se recuperar. No entanto, num ritmo muito mais lento do que o normal.
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Em setembro, o gelo marinho do Ártico atingiu o nível anual mínimo do período de verão: apenas 2.5 milhões de quilômetros quadrados. Essa foi a segunda menor extensão já registrada desde o início do monitoramento por satélite. À medida que o hemisfério norte começa a transição para o inverno, a expectativa é que o gelo se recupere. No entanto, a situação do Ártico é muito mais preocupante desta vez.
Diferenças entre 1981 e 2010 na região. Gif por Gizmodo via NASA Scientific Visualization Studio.
Pelas primeiras duas semanas de outubro, o gelo marinho da região cresceu apenas 235 mil quilômetros quadrados, menos que um terço da média registrada de 1981 a 2010. Embora o crescimento tenha aumentado na metade final do mês, o mês de outubro de 2016 terminou com a pior área de gelo visível já registrada no Ártico: uma média de 4 milhões de quilômetros quadrados, quase 1.5 milhão de quilômetros quadrados a menos do que o normal.
Para colocar isso em perspectiva, 1.5 milhão de quilômetros quadrados é praticamente o tamanho do estado de Amazonas.
Não deve ser supresa para ninguém o que está por trás dessas alterações no crescimento do gelo do Ártico: muito calor. Dados liberados nesta semana pelo Centro Nacional de Dados sobre Neve e Gelo dos EUA (NSIDC, na sigla em inglês) mostram que as temperaturas de superfície nos mares de Beaufort e Chukchi, junto com a costa Euroasiática e o mar Siberiano Oriental, ficaram cerca de 3 graus Celcius acima da média para este período do ano. As temperaturas do ar também estão estão excepcionalmente quentes em grande parte do Ártico neste momento.
De acordo com Julienne Stroeve, pesquisadora do NSIDC, ainda é muito cedo para dizer se esse início lento é um indicativo de outro recorde negativo para o gelo marinho da região. “Não é necessariamente incomum o crescimento do gelo parar durante o inverno” contou ao Gizmodo. “Mas esse ano tem sido um ano interessante – já tivemos muitos recordes.”
Anomalias da temperatura da superfície do mar em 25 de outubro de 2016. Imagem: NSIDC
De fato, esse ano tem sido marcado por temperaturas muito acima do normal por todo o Ártico, resultando em recordes negativos de gelo durante a primavera e o inverno. A onda de calor da região reflete os recordes de temperaturas mensais que temos atingido com uma regularidade brutal em todo o mundo, assim como os registros anuais de calor. (No mês passado a NASA anunciou que 2016 iria desbancar 2015 e se tornar o ano mais quente já registrado. 2015 tinha desbancado 2014.)
Se o crescimento lento persistir, conta Stroeve, o gelo marinho do Ártico talvez não consiga chegar a espessura habitual de inverno, de 1,5 ou 2 metros. Com o gelo mais fino, o derretimento durante a primavera é mais rápido, o que gera problemas para ursos polares e outros animais que dependem do gelo para caçar e reproduzir.
Extensão do gelo marinho no Ártico. Imagem: NSDIC.
Além disso, esse cenário indica com um verão livre de gelo por mais tempo. E isso significa que os mares do Ártico irão absorver ainda mais calor, potencialmente provocando maiores reduções do gelo. “Você começa a entrar num ciclo” disse Stroeve.
Quando o Ártico ficar completamente livre do gelo nos verões – uma marca que deve ser atingida em 2050, se as emissões de carbono continuarem no mesmo ritmo – haverá muito espaço para os cruzeiros de luxo e uma vasta área para as nações brigarem pelo direito de exploração de petróleo. Que ninguém jamais diga que o navio da humanidade naufragou em silêncio.
[NSDIC]
Imagem do topo: foto 21 de maio de 2016 mostra o gelo do mar Ártico no mar de Beaufort tirada pelo MODIS (Moderate-Resolution Imaging Spectroradiometer), da NASA. Crédito: LANCE (Land Atmosphere Near-Real Time Capability for EOS, NASA/GSFC.