Os pontos brilhantes no planeta-anão Ceres são mais misteriosos do que se pensava

Dois novos artigos científicos revelaram mais detalhes e mais dúvidas sobre o Ceres, planeta-anão que tem sido analisado a partir da sonda Dawn, da NASA.

Depois de meses de especulações, cientistas anunciaram que os pontos brilhantes no planeta-anão Ceres eram depósitos gigantes de sal. Caso resolvido, certo? Não exatamente. Desde então, conseguimos mais informações sobre essas áreas e sobre as crateras de Ceres, que está se tornando um lugar muito mais estranho do que imaginávamos.

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Dois novos artigos científicos revelaram mais detalhes e levantaram mais dúvidas sobre o planeta-anão, que vem sendo analisado desde o ano passado a partir da sonda Dawn, da NASA. O primeiro estudo, publicado na revista Nature, alega que o material brilhante encontrado na cratera Occator é formado por carbonato de sódio, mineral que se forma a partir de aberturas hidrotermais e é conhecido por ser utilizado em produtos de limpeza.

Se essa pesquisa se sustentar, Ceres poderá ser considerado um dos planetas mais ricos em carbonato em nosso sistema solar, ao lado da Terra. O dado é frustrante para os cientistas, especialmente se considerarmos o segundo estudo, publicado na Nature Geoscience, que aponta que Ceres é mais seco do que imaginávamos. A quantidade de gelo que se derreteu para formar carbonatos ainda é um mistério, no entanto.

A origem da água no nosso sistema solar

Esses enigmas são o centro de um quebra cabeça maior, que implica a existência da vida na Terra: a origem da água em nosso sistema solar.

Alguns cientistas acreditam que toda a água do nosso sistema solar surgiu do cinturão de Kuiper, uma região do nosso sistema solar próxima a órbita de Plutão que possui muitas rochas de gelo. Os exóticos minerais presentes em Ceres talvez apontem para uma origem externa, o que poderia quebrar a relação entre o gelo no cinturão de Kuiper e os oceanos na Terra.

“Entender a água de Ceres — qual a quantidade, como surgiu e se manteve, se foi formada por um cinturão de asteroides ou não — tem implicações muito importantes na compreensão da formação do nosso sistema solar” contou Bland. “Acredito que Ceres seja um ótimo alvo de estudo para a sonda Dawn e futuras missões, como uma forma de estabelecer relações entre os sistemas solares.”

Histórico

Com as novas informações colhidas pela sonda da NASA, as teorias sobre os pontos brilhantes e como eles se relacionam com o interior de Ceres evoluíram. Antes da chegada da sonda, os cientistas suspeitavam que as crateras do planeta-anão estavam cheias de água congelada – vindo, talvez, de um oceano subterrâneo.

Os primeiros dados da sonda acabaram revelando que o material presente na cratera estava muito brilhante para ser água pura — alguma forma de sal deveria existir ali. Essa hipótese foi corroborada num estudo publicado na Nature em dezembro, que analisou dados de comprimento de onda a partir das fotos enviadas pela Dawn e concluiu que os pontos brilhantes provavelmente possuíam sulfato de magnésio com um pouco de água congelada.

Os estudos mais recentes apontam que há menos água, mais sal e diversos mistérios em aberto no interior do planeta-anão. Analisando dados em alta resolução do Espectrômetro de Mapeamento em Radiação Visível e Infravermelha, Maria Cristina De Sanctis, do Observatório Astronômico de Roma, afirmou que o material presente na maior cratera de Ceres, a Occator, não deve ser sulfato de magnésio. Na verdade, a análise aponta para a presença de carbonato de sódio.

Minerais de carbonato surgem da água do mar e formam a base do calcário, esqueletos de corais e cascas de diversos crustáceos e moluscos. “Esses minerais só podem ser formados em um ambiente com água líquida”, disse De Sanctis ao Gizmodo, lembrando que a busca pela água em Marte sempre foi feita em conjunto com a busca por carbonatos.

Já foram encontradas evidências de minerais de carbonato em Marte, indicando que o Planeta Vermelho um dia teve oceanos. O material também já foi encontrado em Encélado, uma das luas de Saturno. Se De Sanctis e seus colegas estiverem certos, Ceres será mais um na lista. “As quantidades [de carbonato] que vimos em Ceres são muito maiores do que em qualquer outro lugar do sistema solar, salvo a Terra”, contou.

Andreas Nathues, cientista da Universidade de Max Planck, que propôs a hipótese do sulfato de magnésio, ainda não está totalmente convicto. “Essas análises são mais profundas do que aquelas que fizemos — já que hoje temos mais informações”, disse ele ao Gizmodo, afirmando que agora a teoria do sulfato de magnésio está claramente fora de questão. Porém, segundo ele, “é muito difícil explicar carbonatos nessa quantidade. Ainda é um mistério.”

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A topografia de Ceres, com diversas crateras. Imagem: NASA/JPL-Caltech/UCLA/MPS/DLR/IDA

Água em Ceres

A análise de De Sanctis não gerou nenhuma evidência de que exista água em alguma das crateras de Ceres. Outro estudo, liderado por Michael Bland do Serviço Geológico dos EUA, indica que o interior do planeta-anão é bem seco.

“Antes da chegada da sonda, havia essa expectativa de que Ceres fosse relativamente rico em gelo”, disse Bland ao Gizmodo, descrevendo um conhecido modelo que considerava que o interior do planeta-anão fosse rochoso e coberto por uma espessa camada de água congelada.

Esse modelo, no entanto, não corresponde ao que se encontrou de fato na superfície do planeta-anão. “O trabalho que fiz antes da chegada da sonda sugeria que Ceres teria muito gelo, e que as crateras deveriam se tornar relativamente mais niveladas à superfície em um curto período de tempo”, conta Bland, explicando como a lenta migração do gelo do subsolo iria preencher as crateras, tornando-as mais rasas.

“Esse é um processo que observamos em várias luas no sistema solar, inclusive em Encélado. Mas assim que a sonda chegou a Ceres, ficou óbvio que lá as crateras são maiores e mais profundas — em alguns casos, possuem de cinco a seis quilômetros.” Combinando os últimos dados topográficos com alguns modelos numéricos, Bland estima que o subsolo de Ceres seja formado por até 35% de água congelada.

Ainda assim, essa quantidade seria o suficiente para formar as solução líquidas que geram carbonatos — mas como um pequeno planeta com temperaturas de 105 graus Celsius negativos poderia ter água líquida em sua superfície? Esse é outro mistério. “Eu acho que essas são duas peças do quebra cabeça e ainda teremos muito trabalho até juntá-las”, disse Bland.

Imagem do topo: NASA/JPL-Caltech.

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