No fim das contas, bebida alcoólica não é tão boa para o coração, diz estudo
Talvez seja preciso menos álcool do que pensávamos para causar danos ao coração e encurtar nossas vidas. Isso é o que sugere um novo estudo publicado nesta quinta-feira (12), pelo The Lancet. Para muitos, o limite pode ser menos do que um drinque por dia.
• Ficar acordado até tarde da noite faz aumentar suas chances de morrer mais cedo, diz estudo
• Lentes de contato que escurecem no sol vão te proteger de raios UV (e te deixar assustador)
Usando dados populacionais atuais, os pesquisadores estudaram cerca de 600 mil pessoas em 19 países e separaram-nas em diferentes grupos, baseados em níveis autodeclarados de consumo de bebida alcoólica. Então, depois de levar em conta fatores como idade, educação e histórico de fumante, compararam seus níveis de várias condições médicas, como insuficiência cardíaca, derrame e aneurisma fatal (uma veia sanguínea inchada que pode se romper) ao longo de um período mediano de sete anos e meio. Eles também calcularam a expectativa de vida média para cada grupo.
De forma parecida com pesquisas anteriores, eles descobriram que consumidores relativamente pesados de bebida alcoólica estavam mais propensos a morrer mais cedo. Tomar dez ou mais doses por semana foi associado com uma expectativa de vida de um a dois anos menor para a pessoa média de 40 anos de idade, em comparação com alguém que bebia até uma drinque por dia, enquanto tomar 18 ou mais doses foi associado com uma expectativa de vida cerca de cinco anos menor.
Os pesquisadores não conseguiram encontrar um benefício claro do consumo moderado para a saúde do coração, algo que outras pesquisas descobriram. Um maior consumo de álcool foi associado a menos ataques cardíacos. Mas não houve nível de consumo associado a um risco menor de outras condições, como derrames, insuficiência cardíaca ou aneurismas fatais (vasos sanguíneos inchados), entre outras coisas.
“A mensagem chave dessa pesquisa é que, se você já bebe álcool, beber menos pode te ajudar a viver por mais tempo e a diminuir seu risco de desenvolver várias condições cardiovasculares”, disse a autora principal do estudo, Angela Wood, epidemióloga na Universidade de Cambridge, em um comunicado.
Falhas em estudos anteriores
Estudos de décadas atrás já sugeriram que existe uma espécie de curva em J quando se trata de consumo de bebida alcoólica e a saúde cardíaca. Não beber álcool algum é pior do que beber um pouco, enquanto beber muito é bem pior do que qualquer uma das opções anteriores. Porém, embora alguns cientistas, assim como a indústria do álcool, tenham propagandeado essa pesquisa como prova de que o consumo moderado pode te manter saudável e vivo por mais tempo, outros cientistas apontaram falhas gritantes na teoria.
Muitos estudos não levaram em conta os antigos consumidores de álcool que pararam de beber completamente ao incluírem-nos como parte da população que não bebia que foi comparada com aqueles que bebem. Esses ex-consumidores tendem a parar de beber em parte porque estavam com problemas de saúde, portanto, não separá-los pode distorcer os números em favor da bebida. E estudos mais recentes descobriram que os supostos benefícios para a saúde ao beber desaparecem quando você leva em conta esses erros na concepção dos experimentos (os autores do estudo atual decidiram evitar esse problema apenas olhando para os consumidores de álcool atuais).
Enquanto isso, outras pesquisas mostram há muito tempo que beber regularmente em qualquer nível aumenta o risco de câncer, especialmente em mulheres — uma ligação que um número pequeno de pessoas sabe que existe, de acordo com pesquisas recentes.
Existe também o problema de definir o que o consumo moderado de fato é. O Reino Unido diminuiu seus níveis de bebida recomendados para homens em 2016 e agora sugere que ninguém tome mais de um drinque por dia. Mas outros países não fizeram isso. Os Estados Unidos, por exemplo, ainda diz que os homens podem beber seguramente até dois drinques por dia.
“Este poderoso estudo pode ser uma leitura séria para países que definiram suas recomendações em níveis mais altos do que o Reino Unido, mas isso parece reforçar amplamente as diretrizes do governo para o Reino Unido”, disse Jeremy Pearson, em um comunicado. Pearson é diretor médico associado da British Heart Foundation, uma instituição de caridade que ajudou a financiar o estudo atual. “Isso não significa que devemos descansar sobre nossos louros, muitas pessoas no Reino Unido bebem regularmente acima do que é recomendado.”
A história se repete nos Estados Unidos. De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, mais de dois terços dos americanos relatam beber mais do que a quantidade recomendada pelo menos uma vez ao mês.
Em uma nota relacionada, o principal braço de pesquisa do governo dos EUA — os Institutos Nacionais de Saúde (NIH, na sigla em inglês) — está no meio de uma controvérsia em torno de um estudo em andamento que pretende provar se o consumo moderado de bebidas alcoólicas pode ser saúde ou não para o coração.
O estudo de US$ 100 milhões do NIH, que começou no ano passado e deve continuar por mais cinco anos, foi em grande parte financiado por meio de doações indiretas de cinco grandes empresas de álcool. Reportagens recentes do New York Times alegaram que vários dos cientistas principais envolvidos no estudo, assim como funcionários dos NIH, solicitaram essas doações antecipadamente, sugerindo que seus resultados absolveriam a indústria do álcool. Outras reportagens também alegaram que os NIH tentaram ignorar ou desviar os financiamentos de estudos críticos à indústria nos últimos anos.
Imagem do topo: Pixabay