O cientista faça-você-mesmo que está aplicando engenharia genética em si próprio

“Se algo der errado, eu posso apenas cortar aquela parte da pele”. Josiah Zayner tomou um gole de sua cerveja e olhou para a luz no palco. Ele já estava meio bêbado. Ele também não tinha preparado um discurso. Tatuado e com o cabelo azul-cinzento, ele estava inquieto. Mas 150 pessoas tinham vindo de todo […]

“Se algo der errado, eu posso apenas cortar aquela parte da pele”.

Josiah Zayner tomou um gole de sua cerveja e olhou para a luz no palco. Ele já estava meio bêbado. Ele também não tinha preparado um discurso. Tatuado e com o cabelo azul-cinzento, ele estava inquieto. Mas 150 pessoas tinham vindo de todo o país para ouvi-lo falar –o louco rei-pirata da biotecnologia.

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“Tudo está vindo do meu coração”, disse ele, engasgando um pouco. “Tudo o que você vai ouvir hoje é totalmente eu”.

O público de Zayner estava sentado no decadente salão de um antigo clube do sindicato de lixeiros de Oakland. Eles tinham vindo de universidades, startups e laboratórios de garagem, unidos se não apenas por um amor à ciência cidadã, por uma curiosidade sobre o que exatamente Zayner está fazendo.

Um nerd de computador que virou cientista da NASA e depois um cínico em relação à ciência, Zayner é algo como um auto-proclamado líder de um pequeno porém crescente movimento de biohacking. Ele preside um círculo livre de cientistas profissionais e autodidatas que acreditam que a ciência inovadora não precisa tanto assim de um laboratório preparado ou de um diploma.

Zayner estava prestes a falar sobre suas tentativas de modificar geneticamente o próprio corpo, um esforço que sempre levantou dúvidas e preocupações, inclusive do governo federal.

Mas antes, ele ia falar sobre a sua alma e a santidade da ciência. O público ouvia com muita atenção.

Ingredientes necessários para a técnica de edição genética CRISPR em um ser humano, como descrito no Guia Zayner de CRISPR faça-você-mesmo. Cortesia da imagem Josiah Zayner

“Este é nosso mundo agora, o mundo do par de base e do aminoácido, a beleza da proteína”, ele começou, exaltando o nascimento de uma era definida pela biologia sintética e seus avanços na compreensão dos fundamentos da vida.

Ele projetou o Manifesto Hacker de 1986 em uma imponente tela atrás de si. Zayner frequentemente traça paralelos entre os primeiros hackers de computador e os biólogos faça-você-mesmo de hoje: Ferramentas como a engenharia genética estão preparadas para reformular drasticamente o nosso mundo, e ele acredita que os biohackers podem ser os únicos capazes de libertá-las para o mundo. Ele começou a ler em voz alta o manifesto como se estivesse declamando um sermão científico, balançando para frente e para trás, possuído pelo peso das palavras. Sua voz ficava mais próxima de um grito com cada linha.

Josiah Zayner em seu antigo laboratório. Cortesia por Josiah Zayner

“Nós exploramos e vocês nos chamam de criminosos”, ele leu, citando o manifesto. “Nós existimos sem cor, sem nacionalidade, sem preconceito religioso e vocês nos chamam de criminosos. Vocês constroem bombas atômicas, vocês fazem guerras, vocês assassinam, enganam, mentem para nós e tentam nos fazer acreditar que é para nosso próprio bem, contudo nós somos os criminosos”. Na época, ninguém tinha realmente chamado ele de criminoso, mas meses mais tarde, um aviso emitido pelo FDA daria mais significado para a sua leitura.

Ele se virou para a platéia para um final dramático.

“Sim, eu sou um criminoso”, ele leu. “E o meu crime é o da curiosidade”.

Aplausos irromperam. Zayner tomou outro gole de sua cerveja.

“Isso diz literalmente: ‘Não usar em humanos’”

Isso foi em agosto. Alguns meses antes, sentei-me em uma bancada na sede do nada perto dO esterilizado laboratório de Zayner em West Oakland enquanto ele rasgava células mortas da pele de seu antebraço com fita adesiva, em preparação para um experimento. Ele queria modificar geneticamente células da pele de seu corpo para deixá-las de uma cor mais escura – não seu corpo todo, mas uma pequena parte circular que acabaria parecendo uma tatuagem de henna se funcionasse.

Primeiro passo: fita adesiva. Em seguida, ele iria espalhar um plasmídeo de DNA contendo A enzima tirosinase sobre sua pele, a fim de estimular a produção de melanina do seu corpo e (se tudo funcionar) persuadir um pequeno pedaço de pele no antebraço esquerdo ficar um tom ligeiramente mais escuro.

Pelo menos teoricamente, o plasmídeo deveria afundar na sua pele, penetrar suas células e fazer com que as células sobre-expressem o gene da tirosinase, aumentando a quantidade de melanina da pele, causando mudança de cor na mancha em forma de círculo. Ele estava copiando um artigo que ele tinha lido no qual cientistas usaram um método de entrega tópica de gene semelhante para dar um gene diferente para ratos.

“O interessante é que, se funcionar, vai durar?” Zayner me disse, com uma GoPro amarrada à sua cabeça e uma cerveja em cima da mesa, enquanto enchia uma pipeta com a mistura de DNA para espalhar sobre a pele. “Ou vai ser como um bronzeado e desaparecer?”.

Zayner, 36 anos, tem um Ph.D. em bioquímica e biofísica da Universidade de Chicago, mas há alguns anos, ele decidiu deixar a comunidade científica estabelecida – e um programa de pesquisa da NASA – para dedicar seu tempo em vender suprimentos baratos para engenharia genética online, fomentando a revolução biohacker, uma pipeta made-in-china por vez.

Com a venda de kits para engenharia genética faça-você-mesmo e suprimentos de ciência básica tanto para amadores quanto escolas, Zayner disse que seu site Odin conseguiu arrecadar cerca de U$ 500.000 em receita bruta.

Quando a tecnologia de engenharia genética CRISPR entrou em cena em 2012, prometendo tornar a engenharia genética mais simples, mais rápida e mais barata, ele estabeleceu um nicho de hobby já bem ativo de cientistas faça-você-mesmo que procuravam modificar geneticamente plantas, insetos, animais e até mesmo humanos com as próprias mãos.

Zayner vê a genética como o equalizador final: ele sonha um dia em que deixaremos de ser limitados ao DNA com o qual nascemos, cada pessoa será livre para hackear seu próprio genoma para aumentar sua inteligência, mudar sua cor dos olhos ou até mesmo curar as doenças que no afligem com a mesma facilidade que nós, por exemplo, fazemos um site no Squarespace.

Esse futuro ainda está distante. Mas os últimos anos viram progresso científico suficiente para tornar o sonho de Zayner razoavelmente menos louco do que antes. Este ano, a Food and Drug Administration (equivalente à Anvisa dos EUA) aprovou o que chamou de“terapia de primeiro gene,” um tratamento para a leucemia infantil que funciona modificando geneticamente as próprias células do sangue de um paciente. E em novembro de 2017, em um grande feito, os pesquisadores alteraram geneticamente células de um homem enquanto elas ainda estavam dentro de seu corpo. Enquanto isso, Zayner está fazendo o que pode para tornar real um futuro do CRISPR recreativo, experimentando nele mesmo.

Cada experimento tem ficado cada vez mais ousado, com um risco mais elevado. Em 2016, ele ganhou notoriedade para a realização de seu próprio transplante fecal em uma tentativa de tratar problemas de estômago que, durante anos, o assolavam.

Na época, especialistas disseram que a chance de ele conseguir qualquer coisa além de ficar muito doente era essencialmente zero. Zayner diz que funcionou. Um sequenciamento de laboratório independente feito após o procedimento descobriu que a composição bacteriana de sua própria matéria fecal tornou-se mais semelhante ao de seu doador, e o estado de seus movimentos intestinais melhoraram drasticamente. Mas, como a maioria das coisas que Zayner faz, seu experimento não tinha o rigor típico da pesquisa científica. Não havia vários participantes do estudo ou grupos de controle ou sequer um ambiente totalmente estéril, o que torna difícil tirar conclusões definitivas sobre o experimento ou deduzir como ele pode funcionar a longo prazo.

Em seguida, no início de 2017, ele havia infundido suas células da pele com a proteína verde fluorescente de uma água-viva em uma tentativa de fazer a sua pele brilhar. O experimento não conseguiu transformá-lo com sucesso em uma lâmpada viva, mas uma biópsia da pele revelou que pelo menos momentaneamente a proteína foi replicada dentro de seu corpo, tornando ele muito provavelmente o primeiro híbrido humano-água-viva. O experimento que eu estava lá para testemunhar foi ainda mais extremo.

“A proteína verde fluorescente realmente não interage com qualquer coisa em suas células, ela só vai lá e emite fluorescência”, ele me disse. “A coisa louca dessa nova experiência é que realmente vai modificar o metabolismo das minhas células um pouco, o que é um pouco assustador”.

Ele levantou o frasco contendo o DNA e estremeceu. “Meu Deus, isso literalmente diz ‘não usar em humanos”, disse ele.

O gene que Zayner estava prestes a colocar em suas células da pele está presente em abundância em pintas escuras que podem se tornar cancerosas. “Eles não encontraram nenhuma associação entre ele e o câncer, mas eles o identificaram como um marcador para o câncer. Estava presente na cena do crime”, ele disse.

A presença na cena do crime não foi suficiente para convencê-lo: “Eu confio na ciência que está estabelecida, e eu acho que vai ficar tudo basicamente ok”, afirmou. Mesmo se a sua auto-experimentação acabar causando câncer, ele racionalizou que seria possível um médico tratá-lo. Ele só estava aplicando o DNA topicamente para um pequeno pedaço de pele, ele sentiu que era provável que os efeitos colaterais indesejados também seriam isolados naquele pedaço de pele.

“Se algo der errado, eu posso apenas cortar essa parte da pele”, disse ele.
Mas, realmente, quando você está fazendo algo que nunca foi feito antes, é impossível prever o que pode dar errado.

Zayner tinha originalmente planejado se injetar com um novo gene usando o sistema de edição de gene CRISPR-cas9, mas decidiu na época que era muito arriscado.

“Uma vez que você injeta, então ele vai começar a entrar em sua corrente sanguínea e que pode ser um pouco mais perigoso”, Zayner disse enquanto ele espalhava o DNA em seu braço, e depois secou sua pele usando uma ferramenta de solda. “Eu pensei, se isso funcionar e eu ficar com câncer, eu penso comigo mesmo: ‘Bem, isso valeu totalmente a pena para pegar e morrer de câncer? A resposta foi não”.

Aparentemente, ele mudou de ideia. Cinco meses depois, eu sentei na platéia em uma conferência de biotecnologia enquanto Zayner espetava uma agulha contendo CRISPR-cas9 e um gene para promover o crescimento muscular em seu antebraço esquerdo.

“Eu pensei, se isso funcionar e eu ficar com câncer, eu refleti comigo mesmo: ‘Bem, isso valeu totalmente vale a pena para pegar e morrer de câncer?’”

CRISPR é uma tecnologia nova em comparação com outras estratégias de engenharia do genoma, e a literatura científica tem sugerido que usá-la pode produzir efeitos indesejados.

“Eu meio que tenho esse lema agora, se todo mundo acredita em algo, então eu deveria pesquisar o oposto”, ele me explicou mais tarde. Uma vez, ele me disse que tinha acreditado que o uso de CRISPR era muito perigoso, pois poderia resultar em muitos efeitos indesejados. Em seguida, ele foi fundo na investigação. Disse que os dados que encontrou o persuadiram de que os potenciais efeitos colaterais do CRISPR tenham sido exagerados.

O quão numerosas ou graves essas edições não intencionais são, tem sido um assunto de debate científico significativo, e alguns cientistas compartilham sua opinião de que os temores são exagerados. Ainda assim, se injetar com CRISPR quando não há nenhum debate sobre se ele pode causar câncer, parece uma idéia terrível.

Zayner discorda. Ele costumava fumar, um hábito com um risco bem documentado de câncer. Ele imagina que as chances de pegar câncer com CRISPR são provavelmente menores. (Nós realmente não sabemos se isso é verdade). Ele se pergunta, por que fumar é relativamente socialmente aceitável, mas a engenharia se geneticamente por diversão não é.

A engenharia genética ainda não é exatamente fácil, é mais complicado do que derramar algumas coisas em um tubo de ensaio e misturar. Mas qualquer um pode usar um software como o DeskGen para projetar seqüências de DNA personalizadas e, em seguida, pedir o DNA pela internet. Lugares como eBay agora vendem equipamento de laboratório usado por algumas centenas de dólares, ao invés de milhares.

Por U$ 159, Odin [a loja de Zayner] vende um kit contendo tudo que você precisa para fazer o seu próprio fermento que brilha. Por U$ 382, uma outra empresa, Amino, vende um laboratório de mesa chamado DNA Playground que parece um brinquedo da Fisher Price, mas permite a qualquer pessoa “criar bactérias como um profissional”.

A garagem em Burlingame que era a casa da Odin antes de ser transferida para Oakland. Cortesia da imagem: Josiah Zayner

Zayner não é a única esperança de estimular uma febre de biologia faça-você-mesmo. O número de laboratórios de ciência comunitária nos EUA cresceu em um rápido ritmo — começando com a abertura do Genspace no Brooklyn em 2010 — criando espaços formais de hackers para reunir e aprender a mais recente ciência. Zayner nem sequer é a primeira pessoa a realizar a engenharia genética não regulamentada. No ano passado, a CEO da BioViva, Liz Parish, transformou-se no primeiro paciente para uma terapia anti-envelhecimento que a sua companhia está pesquisando. E o microbiólogo Brian Hanley no início de 2017 ganhou atenção por tentar usar a terapia genética para fortalecer seu corpo.

Mas poucos têm ampliado os limites do biohacking tão consistentemente ou tão publicamente quanto Zayner. Ele tem ajudado pacientes com câncer terminal tentarem criar seus próprios tratamentos personalizados com base em pesquisa experimental (embora seja uma possibilidade remota de que esses tratamentos irão funcionar). Junto com se injetar com CRISPR, ele publicou um “Guia CRISPR humano faça-você-mesmo” online e começou a vender o mesmo DNA que promove o crescimento muscular que ele tinha injetado em si mesmo por U$ 20. (A FDA não quis comentar sobre a legalidade de quaisquer produtos específicos). Ele brigou com os reguladores alemães tentando proibir seus kits CRISPR da Alemanha e com os reguladores da FDA que tentaram proibir um kit para fazer fermento que brilha nos EUA. Ele expõe no Twitter e Facebook sobre o que ele vê como falhas da ciência exclusiva praticada em laboratórios fechados da indústria e academia.

“Todos os meus amigos agora estão trabalhando em empregos de pós-doutorado que pagam U$ 40.000 por ano com o seu Ph.D. É este sistema de culto e a ideia de que um dia eles poderiam ter seus próprios laboratórios que os prendem a isso”, ele me disse há quase dois anos, quando eu o conheci pela primeira vez. Apenas, talvez, a construção de uma forte comunidade faça-você-mesmo comunidade possa começar a desgastar a exclusividade e democratizar a ciência para todos. “Eu sou tipo foda-se o sistema”, ele disse. “A ciência é uma coisa classista. O faça-você-mesmo pode quebrar isso”.

“Meio razoável”

Zayner foi sem surpresa cultivando um bom número de inimigos. A FDA reprimiu os kits que Zayner vende para fazer cerveja brilhante e, enquanto não há leis específicas que impeçam que alguém faça experimentos em si mesmos, a agência geralmente desaprova qualquer um que faça qualquer coisa que não tenha sido exaustivamente testado e aprovado pela agência. Só em novembro de 2011, a agência emitiu um severo aviso claramente destinado a dissuadir o faça-você-mesmo.

“A FDA está ciente de que os produtos de terapia genética destinados para auto-administração e kits ‘faça você mesmo’ para produzir terapias genéticas para auto-administração estão sendo disponibilizados para o público”, disse a agência. “A venda destes produtos é contra a lei. A FDA está preocupada com os riscos de segurança envolvidos”. (Quando pedimos para comentar sobre Zayner especificamente, a agência se recusou e me encaminhou essa declaração que você leu há pouco).

O governo alemão também brigou com Zayner, colocando uma proibição de importação de suprimentos de sua empresa depois que alegaram encontrar um patógeno contaminando um de seus kits. (Zayner acredita que a contaminação não se originou em seu laboratório. Ele diz que o sequenciamento de outras amostras de seu laboratório não revelaram nada problemático).

“Josiah é um bom performer, mas não um bom fornecedor de insumos biológicos”, um biohacker europeu me disse.

Zayner é um showman, e nem todos na comunidade científica faça você mesmo são fãs de sua tendência ao espetáculo. Após sua recente auto-injeção CRISPR, um crítico em um grupo do Google para a biologia faça-você-mesmo chamou Zayner de um “idiota”.

“Ele representa brutalmente mal a dificuldade técnica do CRISPR humano faça-você-mesmo, aparentemente por causa de uma narrativa ‘descolada’”, outro biohacker escreveu. “Eu sei que é uma armadilha fácil cair no mundo da biologia faça-você-mesmo, mas eu não sou fã desse tipo de coisa. Acho que é desonesto”.

Outro me disse que a coisa toda “não deixou uma impressão muito positiva”. Mas, surpreendentemente, Zayner também tem atraído uma quantidade razoável de respeito dentro do estabelecimento científico, mais do que você poderia esperar de um cara cuja principal missão é incomodar o estabelecimento. O famoso geneticista de Harvard George Church recentemente assinou contrato como consultor para a empresa de Zayner.

“Eu adoro a ciência cidadã e biologia faça-você-mesmo,” Church me disse. Com todos os dilemas éticos que a ciência sofisticada irá trazer no futuro próximo, Church espera que pessoas como Zayner possam ajudar a tornar a ciência mais acessível ao público em geral. “Ele está nos fazendo um serviço”, disse Church. “O que não significa necessariamente que nada vai dar errado”.

Tao Pan, professor de bioquímica e biologia molecular na Universidade de Chicago, que era próximo de Zayner como um estudante de graduação e sentou-se em seu comitê de tese, me disse que achava que o caminho que Zayner tomou para a sua carreira é “totalmente maneiro” e o elogiou por “sempre pensar fora da caixa”. Ele tinha visto um vídeo do YouTube de um dos experimentos de modificação genética de Zayner, e disse que não estava particularmente preocupado com ele.

“As pessoas vão fazer coisas porque elas podem”, disse Pan. A grande questão, porém, não é se você pode, mas se você deveria.

O choque sobre o que um cientista autodidata pode realizar com apenas algumas centenas de dólares em equipamento de laboratório tem levado algumas pessoas a se perguntarem se a biologia faça-você-mesmo deve exigir licenciamento e regulamentação, ou talvez ser impedida completamente. Zayner abraçou a discussão. Na segunda edição de sua conferência biohacker durante o verão nos EUA no ano passado, Zayner convidou o especialista em biossegurança de Stanford Megan Palmer para dar uma palestra sobre biohacking de forma segura e programou uma discussão entre um biohacker proeminente chamado David Ishee e o bioeticista de Stanford Hank Greely (aviso: eu moderei a discussão).

Greely me disse mais tarde por e-mail que ele achou Zayner “surpreendentemente interessante e agradável para conversar – surpreendentemente razoável”.

A disposição de Zayner de se envolver tem gradualmente conquistado muitos de seus críticos, pelo menos em parte. Ainda assim, disse Greely, ele acha que o compromisso da Zayner à ciência faça-você-mesmo é fundamentalmente equivocada, tanto porque a biologia faça-você-mesmo é “improvável que se torne importante” e porque se ela se tornar importante é “suscetível de causar mais mal do que bem”.

“Eu poderia estar errado, ele poderia estar certo, mas a minha esperança é que a sua forte e sutil mente acabe por tornar-se menos ligada ao faça você mesmo e em vez disso se vire para a concepção de um ecossistema para o desenvolvimento da biociência que seja mais seguro do que o faça-você-mesmo, mas mais democrática e aberta do que o status quo”, disse Greely.

Ele acrescentou: “Eu prefiro estar trabalhando com ele do que contra ele”.


“Não diga às pessoas que eu não sou louco”.

Zayner pode se apresentar publicamente como um hacker temerário com zero limites, mas com o tempo os seus pontos de vista vão mais em direção ao centro. Recentemente, ele tirou alguns de seus piercings e tingiu uma faixa previamente azul de seu cabelo de cinza, pensando que poderia ajudá-lo a parecer um pouco mais normal. Ele espera que um dia o movimento vá se tornar robusto o suficiente para que ele possa chamar a atenção sem ter que experimentar em si mesmo.

Enquanto ele tenta dar a si mesmo uma tatuagem genética, inicialmente ele havia planejado usar uma máquina que proporciona um choque elétrico, a fim de ajudar o novo DNA fazer o caminho até suas próprias células. Ele decidiu não fazê-lo, percebendo que ele precisava fazer testes para descobrir como fazê-lo sem acidentalmente, digamos, dar um choque no seu coração.

“Não diga às pessoas que eu não sou louco” ele me disse.

Ele é crítico de seus dois antecessores na modificação genética faça-você-mesmo porque ele diz que eles o fizeram de tal forma que não há nenhuma maneira real para verificar se a sua experiência funcionou. E quando, no mês passado, uma quarta pessoa se modificou geneticamente, se injetando com uma vacina destinada a suprimir o HIV no Facebook Live, Zayner balançou a cabeça para a abordagem não científica. Para começar, ele disse, o gene que eles estavam usando nunca tinha sido testado em seres humanos, parecia que ninguém tinha lido o artigo no qual o experimento foi baseado, e eles não consultaram especialistas, causando o perigo de criar um tratamento que pode machucar alguém seriamente.

“Quero dizer, não me interpretem mal, eu acho isso incrível”, acrescentou em uma conversa pelo Facebook Messenger. “Tipo, segunda à noite e acontece uma transmissão ao vivo de terapia genética faça-você-mesmo. Qual é o próximo passo? Estou animado”.

Em uma recente visita ao seu laboratório, ele me mostrou algumas outras coisas nas quais ele está trabalhando, incluindo cultivar suas próprias células da bochecha em um ambiente não-estéril. Se crescem o suficiente, ele poderia girar as células em uma máquina de PCR para criar uma massa mais sólida, as fritar e basicamente preparar carne humana.

Um documento do Google Docs intitulado “Ideias” em que Zayner compartilha suas ideias excêntricas, conta, por exemplo, com uma postulação sobre a criação de um organismo a partir do zero para torná-lo “mais ideal”, “proteínas de bactérias para os seres humanos consumirem”, “fazer colheitas crescem tão alto quanto uma árvore”e uma ideia que simplesmente chamava “pele de dragão”.

“Agora começa a diversão”

Depois de cinco ou seis aplicações, seu projeto de engenharia de cor de pele parece ter falhado. Ainda não está claro se a sua experiência CRISPR vai funcionar. Há uma boa chance de não dar certo.

“Falhe feio e rapidamente para que você possa descobrir o que é preciso para ter sucesso”, ele me disse. “Soa como algo que um idiota do Vale do Silício diria, mas é verdade”.

Para Zayner esse não é exatamente o ponto de qualquer forma. Seu compromisso real tem sido o de expandir o alcance e a popularidade da biologia de garagem, em parte, se transformando na imagem dela.

A revolução da engenharia genética ainda é nova. O Bill Gates ou Steve Jobs do biohacking ainda precisa surgir. Em 1957, amadores estavam fazendo memória de computador ao enrolar uma fita magnética em torno de um fio de cobre. Temos um longo caminho a percorrer antes do equivalente de alguém construir o equivalente biológico de um Apple I em sua garagem.

Desde a infame conferência de biotecnologia em que Zayner se injetou com CRISPR na frente de um público, ele afirma que ele recebeu “literalmente centenas” de emails que desejam experimentá-lo.

“A barreira de possibilidade está quebrada”, disse ele, “Então agora começa a diversão”.

Antes disso, Zayner me disse que ele tinha encomendado o gene folistatina e estava simplesmente planejando colocá-lo em seringas e passá-lo pra frente. Ele estava apostando que, provavelmente, seria chocante o bastante.

Seu workshop na SynBioBeta – provocativamente intitulado “Um Guia Passo a Passo Para modificar-se geneticamente com CRISPR”– foi em uma pequena sala que estava lotada. Uma das equipes de documentário que parecem seguir Zayner eternamente estava lá. Enquanto as pessoas entraram, ele distribuiu copinhos que diziam “biohack o planeta” cheios de doses de whisky. Tubos cheios de CRISPR e DNA estavam em cima da mesa, juntamente com um guia impresso de como modificar geneticamente um humano. Fiel à forma, Zayner começou sua conversa com um gole de um frasco cor de cobre.

“Eu criei este DNA em cinco minutos. Se isso não impressionar você, eu não sei o que impressionaria”, disse Zayner, apontando para as seringas. “Eu tenho os dentes muito tortos. O que aconteceria se eu pudesse mudar isso? Nós apenas dizemos às pessoas que elas perderam na loteria genética. Enquanto isso, usamos a pior engenharia genética de todos os tempos: sexo”.

Zayner se alongou bem além de sua meia-hora marcada sobre o trabalho que ele estava fazendo, o guia CRISPR faça-você-mesmo e sua visão de um mundo em que qualquer um possa criar seu próprio destino genético.

“O que está nos impedindo de colocar isso no nosso whisky e começar agora”, disse ele, apontando novamente para a seringa cheia de DNA de aumento muscular.

Uma mulher na plateia, uma funcionária do EPA (Agência de Proteção Ambiental dos EUA), perguntou para Zayner o que estava impedindo ele de tentar suas instruções a si mesmo. Zayner aceitou o desafio. (Mais tarde, ele me disse, “Eu ainda estava com medo e nervoso quando me injetei. Eu quase não o fiz”). Ele pegou a seringa e a espetou em seu braço.

“Eu vou contar pra você o que acontecer”, ele disse.

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