Ciência

Cientistas brasileiros transformam substância do Ipê Roxo em tratamento contra câncer

Pesquisa é promissora, mas ainda está em fase inicial; em testes com animais, a redução do câncer foi de 43%
Imagem: Tony Oliveira/Agência Brasília

Pesquisadores da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) estão desenvolvendo uma reação química para transformar uma substância extraída de um Ipê Roxo em um remédio para o câncer. Segundo a instituição, a pesquisa ainda está em fase inicial, mas os primeiros resultados são promissores.

Realizado no Lacbio (Laboratório de Catálise Biomimética) em parceria com instituições da Inglaterra, de Portugal e da Espanha, o trabalho fez parte da tese de doutorado de Gean Michel Dal Forno no Programa de Pós-Graduação em Química sob orientação do professor Josiel Barbosa Domingos.

Nele, os pesquisadores criaram uma nova metodologia de ativação de uma molécula chamada β-lapachona, encontrada no Ipê Roxo. A principal vantagem é que a substância tem baixo custo de extração e conhecidas propriedades anticancerígenas. No entanto, não pode ser usada em sua forma natural.

Em um comunicado, Gean explicou a razão: “Por que a β-lapachona nunca avançou em testes? Porque ela não ataca só a célula do câncer. Ela também ataca outras células do corpo humano, fazendo com que se tenha efeitos colaterais muito graves. Então não vale a pena usar ela como um fármaco”.

Entenda a pesquisa

Para encontrar uma maneira de fazer com que a β-lapachona afetasse somente as células do câncer, o primeiro passo foi desativar a molécula, transformando-a em um pró-fármaco, uma substância que entra no corpo de forma inativa, para ser ativada depois, em condições específicas – no caso dessa pesquisa, somente quando em contato com o tumor.

“O que a gente faz é pegar essa molécula e fazer uma transformação química. Então, no laboratório, a gente desenvolve uma reação que vai fazer uma pequena alteração na estrutura e faz com que essa molécula deixe de ser um fármaco. Nesse caso, eu tenho pró-fármaco, que é um fármaco que foi modificado para perder sua atividade contra o alvo”, resumiu o pesquisador.

A principal inovação do estudo de Gean é o método para ativar o pró-fármaco nas células cancerígenas. O desenvolvimento usou nanopartículas de paládio e técnicas de química bio-ortogonal, área que foi tema do prêmio Nobel de Química em 2022. Basicamente, a química bio-ortogonal trata de reações que ocorrem em organismos vivos sem alterar as características e os processos naturais daqueles organismos.

Em teste com animais, a redução do câncer foi de 43%

A metodologia passou por testes em células de câncer de mama e de leucemia cultivadas em laboratório e em embriões de peixe-zebra. “Nós enxertamos uma célula do câncer nesse embrião, e junto com essa célula foram também enxertadas essas nanopartículas, que são os nossos catalisadores. Então, quando a molécula que não é ativa chega lá, ela encontra o catalisador e é liberada. Isso faz com que eu só a tenha dentro do tumor, e não afete o resto dos órgãos do modelo animal”, explicou o cientista.

Além disso, os experimentos indicaram um significativo efeito antitumoral. Nos peixes, por exemplo, a redução do câncer foi de 43%, e não registrou danos em outras células dos animais. Com resultados promissores, o processo de ativação teve um pedido de patente depositado pelos pesquisadores, mas ainda são necessárias muitas etapas antes de se chegar aos testes com humanos.

“É um estudo que ainda está numa fase muito inicial. A primeira coisa é que conseguimos descobrir essa nova reação química para liberar esse composto, e conseguimos mostrar que ela já funciona em algum tipo de modelo mais complexo”, completou Gean.

Gabriel Andrade

Gabriel Andrade

Jornalista que cobre ciência, economia e tudo mais. Já passou por veículos como Poder360, Carta Capital e Yahoo.

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