Cientistas descobrem que edição de RNA ajuda polvos a lidar com o frio

Polvos do oceano Pacífico mostraram alterações em 13 mil partes de seu código genético. Algumas delas influenciam proteínas vitais para os processos neurais
imagem de um dos polvos da california que editam rna quando expostos a baixas temperaturas
Imagem: Roger T. Hanlon/Reprodução

Quando a água está fria demais, os polvos reconfiguram mais de 13 mil sequências de letras do seu RNA. A maior parte desta edição molecular está associada ao sistema nervoso e altera proteínas vitais para os processos neurais. Tudo isso, acredita-se, pode ajudar o sistema nervoso desses animais a funcionar melhor quando as temperaturas caem. Bem mais complexo que usar um casaco.

Estamos falando sobre indivíduos da espécie Octopus bimaculoides, conhecido como “polvos de dois pontos da Califórnia. As descobertas são de cientistas liderados por Joshua Rosenthal, do Marine Biological Laboratory, nos Estados Unidos, e por Eli Eisenberg, da Universidade de Tel Aviv, em Israel. O estudo foi publicado na última quinta (8), na revista Cell.

Vamos por partes: o DNA de um ser vivo carrega as instruções para montar todas as suas proteínas – cadeias de compostos químicos chamados aminoácidos, que são um dos principais bloquinhos de construção do nosso corpo. Entre o DNA e as proteínas, porém, existe o RNA mensageiro. 

Ele carrega as instruções para fora do núcleo das células para produzir proteínas. Mas nem sempre é um ctrl c + ctrl v. As células podem, por exemplo, trocar a adenosina, uma das quatro letras (bases nitrogenadas) do código genético (ATCG), pela inosina (I), uma molécula substituta que se comporta como a guanosina (G).

Rosenthal e seus colegas mostraram anteriormente que esse tipo de edição (chamada A-to-I, ou “A para I”), que afeta o RNA por trás da produção de proteínas, acontece em larga escala nos polvos e nas lulas. Os pesquisadores não sabiam por que estes animais fazem isso. Mas uma hipótese era se adaptar à temperatura ambiente, visto que a edição altera o RNA apenas temporariamente.

Então, os cientistas fizeram novos experimentos em que aqueceram ou resfriaram a temperatura de um tanque com os polvos da Califórnia – até 22°C ou 13°C, extremos naturais das águas em que eles vivem. A equipe comparou as informações genéticas dos animais com seu genoma original, analisando mais de 60 mil pontos do material genético em que a edição poderia acontecer.

Nos polvos que ficaram em tanques frios, os cientistas encontraram alterações em 13.285 códons – conjuntos de três bases nitrogenadas do RNA. Isso teria mudado cerca de um terço das instruções para a produção de proteínas. Entre os polvos nos tanques quentes, a edição foi pequena: a equipe encontrou alterações em 550 códons.

Os cientistas descobriram, por exemplo, que a edição de RNA ajustou a função de proteínas que são vitais para a função neural nos polvos. Ela alterou a capacidade de resposta de uma proteína chamada sinaptotagmina, por exemplo, que atua na comunicação entre os neurônios.

Essas descobertas indicam que pelo menos uma função da edição de RNA entre os cefalópodes é uma resposta rápida a condições que poderiam ser perigosas para os animais, como as baixas temperaturas. Outras variáveis ambientais que poderiam ser gatilhos para o fenômeno incluem baixo oxigênio, poluição e mudanças nas condições sociais.

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