De Fukushima às Maldivas: o turismo em meio aos maiores desastres ambientais da história
No início desta semana, o presidente do Turcomenistão, Gurbanguly Berdymukhamedov, disse que o país vai redobrar seus esforços para fechar o Portão do Inferno, um enorme incêndio de gás natural que está queimando no meio do deserto desde 1971.
Extinguir o fogo — resultado de um acidente industrial — é sem dúvida benéfico para o ambiente. Mas isso prejudicaria a economia baseada no turismo que se formou ao redor do fenômeno. Ver a Terra “arrotando” fogo é algo raro, sendo ainda mais difícil de ver quando isso é resultado da insensatez humana. Dito isso, arrumar o problema é com certeza a coisa certa a se fazer.
Mas o Portão do Inferno está longe de ser o único local vítima de desastre ambiental que se tornou um destino turístico ou ocupou um lugar especial em nossa concepção coletiva do mundo. Visitar esses locais é uma proposta um pouco complicada. Existe um apelo inegável em querer ver Chernobyl, por exemplo, por suas qualidades de cápsula do tempo. Mas o colapso que ocorreu lá também descolou milhares de pessoas e resultou em um número de mortes que nem dá para quantificar.
Há formas de visitar esses locais que homenageiam os danos à vida humana e ao mundo natural. E, de fato, há boas razões para fazer isso. Testemunhar as calamidades ambientais em nosso meio pode nos ajudar a entender como o erro humano, a negligência ou a arrogância (ou mesmo a mistura dos três e mais outras coisas) as causaram. Na era das mudanças climáticas, as lições tiradas destes lugares têm se tornado cada vez mais importantes. É somente aprendendo com o que trouxe destruição no passado que poderemos evitar repetir os mesmos erros. Dito isso, vamos aos destinos.
O Mar de Salton
Os mares interiores são, de um modo geral, lugares estranhos e maravilhosos, já que a água salgada está onde supostamente não deveria. Mas o Mar de Salton tem algo especial porque realmente não deveria estar lá. O vale em que fica o Mar de Salton se enche de água ocasionalmente, mas este poço de água salina se formou depois que um canal destinado a desviar a água do rio Colorado foi rompido por águas de enchentes em 1905.
O mar já passou por muita coisa: foi um paraíso de ratos do deserto, uma importante parada para aves migratórias, um lugar onde os peixes vão para morrer, uma fonte de poeira tóxica e um lixão para irrigação e escoamento industrial. Agora, pode ser uma mina de lítio.
Centralia, Pensilvânia
O Turcomenistão não é o único lugar com um enorme incêndio queimando no subsolo. Centralia, na Pensilvânia, era uma comunidade próspera que se tornou uma cidade fantasma depois que um depósito de carvão abaixo dela pegou fogo em 1962. A possível fonte do incêndio foi uma tentativa de limpar o lixão da cidade, que acabou atingindo a antiga mina de carvão.
O fogo por lá é menos dramático do que no Portão do Inferno, já que a maior parte do incêndio é subterrâneo. Mas com o passar dos anos, a paisagem adquiriu uma qualidade sobrenatural à medida que a fumaça nociva emergia de rachaduras. Sem maneiras de apagar o fogo, algumas pesquisas indicaram que aquilo poderia queimar por séculos a fio. Devido aos riscos do monóxido de carbono, junto ao colapso dos poços de mineração subterrânea, os membros da comunidade foram embora e as casas foram demolidas.
Chernobil
Chernobil ocupa um lugar único na imaginação popular. Ele combina o medo da energia nuclear e da Guerra Frio ao mesmo tempo que aponta para a nostalgia e o fascínio pela União Soviética. Muitas vezes, o passado é derrubado ou pavimentado. Mas isso não é uma opção para o colapso de 1986 em Chernobil, dados os riscos da contaminação radioativa. Isso significa que o local e a cidade que o rodeia continuam lá como prova dos danos causados por uma série de erros humanos. Um globo de neve criado pela energia nuclear.
O local se tornou um grande destino turístico e a arrogância que levou ao colapso foi imortalizada em uma minissérie da HBO. Os esforços de limpeza continuaram, incluindo o uso de robôs para lidar com as partes mais radioativas do local do reator. Em uma reviravolta sombria, as mudanças climáticas também podem acabar desencadeando problemas para o local; em 2020, incêndios florestais se espalharam pela zona de exclusão. Embora pareçam ter sido causados por incendiários (especificamente, fanáticos suspeitos do clássico de ficção científica soviético de 1972 Roadside Picnic), as florestas de Chernobil estão sob o mesmo estresse térmico que outras ao redor do mundo.
O Mar de Aral
A cerca de 2.240 quilômetros de Chernobil, está uma calamidade em outra parte da União Soviética. O Mar de Aral já foi o quarto maior lago do mundo. Mas um projeto de irrigação iniciado na década de 1960 para transformar partes áridas do Cazaquistão, Uzbequistão e Turcomenistão em celeiros desviou o rio que alimentava o lago. Em 2014, o grande lago foi reduzido a um pequeno córrego. A seca alimentada pelas mudanças climáticas promoveu a transição do Mar de Aral para uma panela de sal rasa. (A parte mais ao norte da bacia do lago está relativamente decente graças a um projeto de barragem.) No entanto, os restos do legado do lago podem ser encontrados ao seu redor, incluindo um cemitério de navios no Turcomenistão, que agora fica a mais de 150 quilômetros da costa atual do lago.
A Ilha de Plástico no Pacífico
Os oceanos são, no geral, uma confusão entre acidificação, superaquecimento e poluição. Mas a grande Ilha de Plástico no Pacífico é exclusivamente seu maior pesadelo. Os giros oceânicos que giram lentamente, abrangendo milhares de quilômetros, tornaram-se ímãs para o crescente legado humano de plástico. Mas este ponto do Pacífico Norte alcançou um grau de notoriedade além de seus equivalentes em outras bacias oceânicas. Abrangendo uma área de quase 1,6 milhão de quilômetros quadrados, o pedaço de oceano contém cerca de 1,8 trilhão de pedaços de lixo. As redes de pesca fantasma enredaram a vida marinha, as tartarugas marinhas sufocam até a morte com plástico e as ilhas que ocupam a região estão inundadas de plástico com resultados trágicos, como ilustra a foto acima.
Esforços para limpar a região geraram, ao mesmo tempo, elogios e preocupação. Embora o ato de recolher o plástico seja bastante altruísta, ele não resolve o problema subjacente: há mais lixo se acumulando no local do que podemos remover.
Fukushima
Assim como Chernobil, Fukushima se tornou uma fonte de medo da energia nuclear. Foi um tsunami que levou ao desastre da usina nuclear de Fukushima Daiichi em 2011. Desde então, o Japão tem lutado para descobrir o que fazer com o lixo radioativo no local; algumas cidades se ofereceram para guardá-lo enquanto o governo avaliava o despejo de água radioativa no oceano.
A zona de exclusão também se tornou, como Chernobil, um local em que os animais estão voltando a habitar. (Esses animais já haviam sido colocados ali para monitorar níveis de radiação.) Algumas pessoas também estão retornando e até participando de atividades que costumavam fazer por lá, como surfar.
A Ilha de Lixo nas Maldivas
As águas azuis das Maldivas e as praias remotas dos atóis são claramente sua principal atração turística. Enquanto se esconder nos resorts certamente parece uma opção mais relaxante, há outro lugar nas Maldivas que fala sobre os desafios da vida em pequenas ilhas e da taxa pesada dos próprios turistas sentados em resorts. A ilha artificial de Thilafushi é essencialmente uma pilha gigante de lixo, que começou a ser construída em 1992. A ilha expandiu-se para fora e para cima, tornando-se até mesmo um local para outras atividades industriais. Embora o despejo tenha sido temporariamente interrompido em 2011, ele foi reiniciado, e o lixo – parte dele tóxico – continua a se acumular.
Muitas vezes, os impactos do turismo no meio ambiente – de cruzeiros à viagens de avião – são quase invisíveis. O lixo gerado pelos resorts também é convenientemente varrido para debaixo do tapete. Mas Thilafushi – que pode ser visto do ar por voos que aterram nas Maldivas – é um daqueles lugares impossíveis de ignorar.
Lago Okeechobee
O Lago Okeechobee está, na verdade, na raiz de muitos problemas ambientais da Flórida. Não que seja culpa do lago, claro, mas sim como ele foi tratado e usado. Como o Mar de Aral, Okeechobee sofreu o impacto de um grande projeto de engenharia a serviço da agricultura. As águas do lago são essenciais para a indústria da cana-de-açúcar, que fica ao sul. Para ajudar a regular os fluxos para fora do lago, o Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA ergueu um dique no limite sul do lago e uma série de canais que levam água aos campos de cana.
Mas isso gerou um efeito destrutivo no lago. Em 2018, o Lago Okeechobee se transformou em uma proliferação de algas podres devido a vários fatores, incluindo o escoamento de fazendas que foi agravado, em parte, pelo furacão Irma no ano anterior. O Corpo do Exército liberou um pouco dessa água, espalhando as algas tóxicas até a costa. Os cientistas estão preocupados com o futuro do lago, em parte porque há uma camada tão espessa de fertilizante alojada em seu fundo lamacento que poderia desencadear mais plantas tóxicas nos próximos anos, mesmo sem escoamento. Mas como o escoamento não deve parar tão cedo, o maior lago da Flórida está a apenas um furacão ou uma forte tempestade de distância de outra proliferação de algas saídas do inferno.