Esta pode ser a lei mais coesa para a Internet brasileira

Sempre que algum vazamento de informações, furto de contas correntes ou outros crimes assemelhados ganham a mídia, os especialistas consultados começam suas falas com a mea culpa de que tais condutas não são previstas na nossa legislação. O Projeto de Lei 2.793/11, que passou pela Câmara hoje, se apresenta como uma versão enxuta e mais […]
Regulamentação dos crimes de Internet no Brasil.

Sempre que algum vazamento de informações, furto de contas correntes ou outros crimes assemelhados ganham a mídia, os especialistas consultados começam suas falas com a mea culpa de que tais condutas não são previstas na nossa legislação. O Projeto de Lei 2.793/11, que passou pela Câmara hoje, se apresenta como uma versão enxuta e mais coerente do famigerado PL 84/99, do deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG). Parece bom, mas como fica na prática?

As diferenças entre o PL 2793/11, que é assinado por um monte de deputados (Paulo Teixeira [PT-SP], Luiza Erundina [PSB-SP], Manuela D´Ávila [PCdoB-RS] e João Arruda [PMDB-PR], pelo deputado licenciado Brizola Neto [PDT-RJ] e pelo suplente Emiliano José [PT-BA]), e o PL 84/99 são gritantes. Mais curto, sucinto e sem os exageros da proposta do Azeredo, a intenção é complementar, reformar apenas onde é necessário o Código Penal. Isso não é necessariamente bom: se por um lado a simplicidade da proposta é encarada como uma vitória, ela também é exageradamente sucinta, um misto de atraso e esperteza: ela deixa de tocar em pontos importantes que vêm sendo debatidos lá fora sobre direitos na internet e que em algum momento terão de ser debatidas aqui também. Para facilitar a passagem da lei, a melhor saída da proposta foi simplificar tudo, de forma exagerada.

Na prática, o que esse projeto de lei propõe é:

  • Criminalizar o acesso não autorizado a dispositivos de informática, via Internet ou não, majorando as penas decorrentes do crime no caso de prejuízo econômico, obtenção e/ou divulgação de informações privadas e se praticado contra membros do governo;
  • Interrupção de sistemas dos quais dependem a Internet, inclusive sites;
  • Falsificação de cartão de crédito ou débito.

 

Apenas isso. No caso do primeiro item, o crime é de ação privada, ou seja, a vítima precisa representar para que o inquérito seja instaurado e o processo tome seu curso. A exceção é nos casos onde a vítima é membro do governo, casos onde a ação é pública.

As justificativas do projeto de lei batem forte contra o do deputado Luiz Azeredo, classificando algumas medidas e tipificações dela como “demasiadamente abertas e desproporcionais, capazes de ensejar a tipificação criminal de condutas corriqueiras praticadas por grande parte da população na Internet.” À Agência Câmara, Paulo Teixeira, um dos autores do novo projeto, diz que a proposta anterior “cria tipos penais muito amplos, que dão margem para interpretação e podem até criminalizar quem baixa uma música”.

Como o PL 84/99 tramita há muito tempo no Congresso, ele não pode ser mais emendado. O deputado Azeredo criticou a celeridade com que o PL 2793/11, de dezembro passado, tramita por lá — ele foi aprovado hoje na Câmara —, atribuindo à rapidez o recente caso do vazamento de fotos daquela atriz. Seja esse o caso ou não, o que importa é que o novo projeto é melhor que o dele — e aí talvez esteja rolando um pouco de dor de cotovelo, mas relevemos.

O Direito Penal não admite o uso da analogia, instituto muito comum no Direito Civil e em outras áreas das ciências jurídicas. Aquele velho ditado “o que não é proibido é permitido” é realmente válido; a essas situações não previstas chamamos “condutas atípicas” e, por praticá-las, ninguém pode ser punido penalmente.

Porém, quando alguém desvia dinheiro de uma conta via Internet, ele não está praticando uma “conduta atípica”, ele está furtando. E furto é crime, está no artigo 155 do Código Penal. A maioria dos crimes virtuais são crimes bem reais e colocam em questionamento, talvez até em um plano mais filosófico, se existe mesmo essa necessidade de separar o real do virtual. Há? Eu acho que não. E o PL 2793/11 parece seguir essa mesma linha de raciocínio, pois deixa de lado condutas que,  tirando o fato de terem sido praticadas na Internet, não diferem em nada de outras já consideradas ilegais. Ele vai além, inclusive, ao antever o acesso não autorizado a sistemas fora da Internet.

A objetividade e, por que não, o bom senso do novo projeto também o limita ao âmbito penal. O registro de IPs e atividades dos usuários pelos provedores, uma das partes mais polêmicas da Lei Azeredo, é citado nas justificativas como um dos itens que não cabem aqui — e, esperamos, em lugar nenhum.

Parece-me, pois, que o PL 2793/11 é muito feliz por limitar-se ao necessário. Nada além, nada aquém. É um adendo importante ao Código Penal que chega para acrescentar, não para gerar o caos no Direito Penal ou chamar as atenções para si pelos motivos errados. Novamente nas justificativas do projeto, os deputados responsáveis dizem que ele deve ser aprovado depois do Marco Civil da Internet. Muito bem colocado, especialmente porque lá a coisa está um pouco mais casca grossa — há passagens e colocações que ficaram… estranhas. Mas isso é papo para outro post.

Para começar a valer, o PL 2793/11 ainda precisa ser aprovado no Senado e ser sancionado pela Presidente. Passadas essas etapas, ele entra em vigor 120 dias depois. [Agência EstadoPL 2793/11]

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