Atualização dia 15 de abril às 10h45: Incluímos uma contextualização sobre a dosagem utilizada pelo estudo, similar à dosagem usada pelo estudo francês que despertou interesse na cloroquina e as atuais recomendações da Anvisa.
Em um pequeno estudo realizado no Amazonas, o uso da cloroquina para combater o novo coronavírus foi interrompido após causar complicações cardíacas, especificamente arritmia, em alguns pacientes que tomaram doses altas do medicamento.
Entre os tratamentos promissores para combater o COVID-19, o uso da cloroquina tem sido um dos que mais chamam a atenção – principalmente depois de autoridades como o presidente dos EUA e do Brasil falarem publicamente sobre o medicamento.
Como a doença é muito nova, diversos testes clínicos, com várias drogas, estão sendo conduzidos ao redor do mundo. Essa, como outras pesquisas, são preliminares e contém limitações, já que a amostragem é pequena e não havia um grupo de controle com placebo (apenas com doses diferentes).
Essa última limitação está relacionada com a orientação do Ministério da Saúde para o uso da cloroquina em pacientes em estado grave, segundo o artigo. Os efeitos colaterais causados por uma alta dosagem fizeram com que o estudo fosse interrompido.
O estudo brasileiro envolveu 81 pacientes hospitalizados na cidade de Manaus e foi financiado pelo estado do Amazonas. Os resultados foram publicados no medRxiv, um servidor para artigos médicos.
Entre os pacientes, havia um grupo com dosagem menor que tomaram 450mg durante 5 dias, duas vezes por dia, totalizando 2,7g de cloroquina. Um outro grupo tomou uma dose maior, de 600mg diárias durante 10 dias, totalizando 12g de cloroquina. A dose maior, inclusive, é similar àquela que foi supostamente administrada para os pacientes do estudo francês que despertou o interesse de Donald Trump (em PDF).
Em uma nota técnica da Anvisa, as dosagens recomendadas são outras: para o difosfato de clororoquina dosagem de 900mg no 1º dia e 450mg do 2º ao 5º dia; para a hidroxicloroquina 800mg no 1º dia e 400mg do 2º ao 5º dia.
“Os resultados preliminares do teste CloroCovid-19 sugerem que uma dosagem mais alta de CQ [cloroquina] (dose total de 12g durante 10 dias) no COVID-19 não deve ser recomendada devido preocupações de segurança em relação a prolongação de QTc [distúrbio do ritmo cardíaco que pode causar batimentos cardíacos acelerados e caóticos] e maior letalidade, na população brasileira e mais geralmente em pacientes mais velhos em uso de drogas como azitromicina e oseltamivir, que também prolongam o intervalo de QTc”, escreveram os pesquisadores no artigo.
De acordo com a pesquisa, não foi possível estimar um benefício claro do uso da cloroquina em pacientes com síndrome respiratória aguda no grupo de baixa dosagem, já que havia um número limitado de pacientes.
Eles afirmam ainda que os dados preliminares de eliminação de vírus nas secreções respiratórias indicaram baixo efeito da droga em alta dosagem e completam dizendo que “mais estudos iniciando o uso da cloroquina antes antes do início da fase grave da doença são urgentemente necessárias”. Esse, inclusive, é o argumento do virologista Paolo Zanotto, doutor pela Universidade Oxford e professor no Instituto de Ciências Biomédicas da USP. Ele se opõe ao uso da hidroxicloroquina apenas para pacientes graves e diz que a droga deveria ser utilizada em fases anteriores da doença.
Depois de 3 dias do início do estudo, os pesquisadores começaram a notar arritmias cardíacas em pacientes que tomavam a dose mais elevada. No 6º dia de tratamento, 11 pacientes tinham morrido, o que fez com que o ensaio clínico de dose mais alta fosse interrompido. A taxa de letalidade ficou próxima daquela vista nos pacientes que não receberam tratamento com cloroquina anteriormente.
O estudo deve ajudar outros hospitais que estão realizando o tratamento experimental com a cloroquina a terem cuidado com a dosagem da droga.
Recentemente, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) alteraram o texto em seu website removendo a orientações para o possível uso de hidroxicloroquina e cloroquina pelos médicos, retirando o parágrafo que incluía recomendação de doses a partir de evidência “anedóticas”. A versão anterior do site citava doses de 600mg no 1º dia, seguido de doses de 400 mg durante o 2º e 5º dia.
Alguns estudos, no Brasil e no exterior, mostram que a eficácia da cloroquina ainda não é clara o suficiente, embora alguns médicos tenham relatado sucesso. Na semana passada, o diretor da Prevent Senior afirmou que 300 de 500 pacientes já tiveram alta após utilizarem o medicamento em estágio inicial da doença. Já um outro estudo preliminar da Fiocruz e da Fundação de Medicina Tropical mostra que a taxa de mortes com cloroquina equivale à de quem não usa.
Outro tratamento que está sendo testado no Brasil é o uso de plasma de pacientes curados. Os pesquisadores acreditam que o plasma de um indivíduo curado pode ajudar um paciente doente por já conter anticorpos contra a infecção.