EUA matam neutralidade da rede, mas nem tudo está perdido ainda

O povo americano tentou. Apesar do enorme apoio bipartidário para resguardar a internet livre, a Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos (FCC) votou nesta quinta-feira (14) e decidiu ignorar o público, matando as proteções de neutralidade da rede no país. VEJA TAMBÉM: O fim da neutralidade da rede nos EUA irá respingar no Brasil Com […]

O povo americano tentou.

Apesar do enorme apoio bipartidário para resguardar a internet livre, a Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos (FCC) votou nesta quinta-feira (14) e decidiu ignorar o público, matando as proteções de neutralidade da rede no país.

VEJA TAMBÉM: O fim da neutralidade da rede nos EUA irá respingar no Brasil

Com seu familiar sorriso de merda, o presidente da FCC, Ajit Pai, realizou nas coxas uma audiência no comitê sobre sua iniciativa “Resgatando a Liberdade de Internet“. A audiência foi uma fraude como seu nome, apenas uma conclusão inevitável de que, sob a liderança de Pai, a FCC entregaria a grandes empresas de telecomunicação um presente de Natal adiantado.

Em votação que terminou em 3 a 2, a comissão liderada por Republicanos decidiu eliminar as atuais regras de neutralidade da rede e remover os grilhões que evitam que os provedores de internet bloqueiem conteúdo online, desacelere os sites dos concorrentes ou cobre mais do usuário se ele acessar o YouTube, por exemplo. A decisão abre caminho para que os provedores façam o que bem entender, e pode apostar que seus executivos já têm um monte de ideias lucrativas em mente que o povo sequer considerou.

A votação foi brevemente atrasada depois dos comentários de Ajit Pai terem sido interrompidos pela segurança do local. A sala foi evacuada, e uma busca foi feita pelo Federal Protective Service antes que Pai pudesse retomar. A natureza da ameaça não foi divulgada.

Desde o momento em que Donald Trump nomeou Pai, sabíamos que ele estava determinado a matar as proteções de neutralidade. Ele já defendia os interesses dos provedores de internet há anos. Antes de se juntar à FCC, Pai foi advogado da Verizon e trabalhou como conselheiro para o Comitê Judiciário do Senado, sob o comando dos megaconservadores ex-senadores Sam Brownback e Jeff Sessions. Mas não se engane: só porque Pai é um republicano, isso não significa que isso seja um problema bipartidário para o público americano.

Estudos mostram que a grande maioria dos americanos apoiam a regulamentação dos provedores de internet de modo que seja garantido que eles tratem todo o tráfego de internet igualmente. Uma nova pesquisa publicada nesta terça-feira (12) apontou que quatro a cada cinco republicanos apoiavam a neutralidade da rede.

O representante da Califórnia Jerry McNenry pediu a oportunidade de falar na audiência desta quinta (14), mas Pai não permitiu. Como parte de sua dissidência, o comissário da FCC Mignon Clyburn leu uma declaração de McNerny. Ela dizia, em parte:

Por que tamanho clamor bipartidário? Porque a grande maioria dos americanos é a favor de manter fortes as regras de neutralidade existentes. Mas a parte mais triste, para mim, de tudo isso, e é doloroso dizer isso, é que essa é a nova norma na FCC. Uma norma em que a maioria ignora a vontade do povo. Uma norma em que a maioria se mantém ociosa, enquanto as pessoas que elas deveriam servir, que juraram servir, estão prestes a perder tanto.

Em agosto, um estudo financiado pela indústria de banda larga descobriu que 98,5% dos comentários únicos enviados à FCC em relação à neutralidade da rede eram contra o fim das regras que passaram a valer em 2015.

Precisamos especificar como “comentários únicos” porque a FCC recebeu incríveis 23 milhões de comentários, e muitos dos que apoiavam o fim da neutralidade da rede eram enviados por bots fraudulentos que roubavam a identidade de pessoas de verdade, de acordo com o escritório do procurador-geral de Nova York Eric Schneiderman.

Embora a FCC devesse considerar os comentários públicos por um período específico de tempo, a comissão se recusou a cooperar com a investigação criminal de Schneiderman sobre corrupção no processo de consulta ao público. A comissária da FCC Jessica Rosenworcel, uma das duas comissárias Democratas que votaram para manter as regras existentes de neutralidade da rede, explicitamente disse, nesta semana, que “havia evidências nos arquivos da FCC de que havia ocorrido fraude”, mas que a agência não iria cooperar.

Independentemente do processo, da investigação criminal, dos protestos ou da oposição dos legisladores, incluindo alguns Republicanos, Pai e seus amiguinhos desde o começo iriam ignorar o público. O presidente da comissão deixou bem claro seu desdém pela opinião popular e por qualquer estudo que discordasse de sua posição. Ele entrará para a história como um dos fantoches corporativos mais eficazes do governo Trump. E quando deixar o cargo, será recebido de braços abertos pelas empresas de telecomunicação.

Mas isso não significa que tudo está perdido. Embora os provedores de internet tenham amolecido seus discursos que prometiam nunca violar princípios da neutralidade da rede, eles precisam esperar para tirar proveito completo dessa nova liberdade. Existe muito escrutínio público no momento para que comecem a censurar conteúdo. Ações judiciais contestando a decisão chegarão aos tribunais vindo de todos os lados. E com a pressão certa por parte dos eleitores, o Congresso pode até mesmo fazer a coisa certa, aprovando uma lei que corrija essa injustiça.

A neutralidade da rede está morta. Vida longa à neutralidade da rede.

Imagem do topo: Getty

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