Os bairros de Flexal de Cima e Flexal de Baixo, em Maceió, estão –literalmente– afundando. Os quase mil moradores que restaram por lá correm verdadeiro risco de morte: a qualquer momento, eles próprios e suas casas podem ser engolidas pela terra. Em alguns locais, o solo chegou a afundar de 1,5 m a 2 m de profundidade.
Em 2018, estudos estimaram que o chão continuaria cedendo 25 centímetros por ano. Nas próximas décadas, pode chegar a 4 metros. Há, ainda, risco de abertura de crateras e desabamentos.
As cerca de 800 famílias da região começaram a notar as primeiras rachaduras nos imóveis e o afundamento repentino do solo a partir de 2020. Foi então que surgiu o temor de que teriam o mesmo destino que outros bairros da capital alagoana, como Pinheiro, Bom Parto e Mutange: desocupação total por risco de segurança no solo.
Escavações para encontrar sal-gema seriam a principal causa da deterioração. A mineração pertence à empresa Braskem, controlada pelo grupo Odebrecht (Novonor), como registrou reportagem lançada em março pelo site Brasil de Fato.
O sal-gema pode ficar até mil metros de profundidade e demanda escavações pesadas para ser alcançado. No caso de Maceió, a exploração foi desenfreada: a Braskem abriu 35 minas no subsolo para extrair sal-gema durante os últimos 40 anos.
Isso provocou tremores de 2,5 pontos na escala Richter em 2018 e forçou a desocupação dos 4 bairros – o que repercute agora, em Flexal.
Assim como em Maceió, a mineração desenfreada também pode ter originado o buraco gigante descoberto no Chile no último sábado (30). Há indícios de que o sumidouro está crescendo depois da realização de obras subterrâneas para escavar cobre. O buraco está a apenas 600m de distância de povoados e já coloca comunidades inteiras em risco.
Quando começou em Maceió
Em 2018, uma forte chuva escancarou o que acontecia embaixo do solo. À época, um tremor de terra causou danos em ruas e casas no bairro Pinheiro, um dos mais tradicionais de classe média de Maceió.
Uma reportagem da BBC do final de 2021 retratou os bairros como “cenários pós-guerra”. As ruas vazias têm casas destruídas e muros pichados –verdadeiras cidades fantasma. A instabilidade repercutiu para bairros vizinhos: houve registro de novos tremores em Bebedouro, Bom Parto e Mutange.
O bairro Farol também teve uma parcela de casas danificadas. Mesmo em área central da capital alagoana, cerca de 64 mil pessoas saíram ou deverão sair de suas casas, segundo levantamento da Prefeitura de Maceió.
No bairro Pinheiro, casas e prédios de classe média –alguns de luxo– e até um hospital mudaram dali. O Mutange, por exemplo, já está 100% desabitado. Em todos, até o trem deixou de passar por lá.
O que dizem as autoridades
Em maio de 2019, a CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Naturais), o Serviço Geológico do Brasil, constatou que a mineração foi a causa central do afundamento. À época, a Braskem questionou o laudo, mas depois recuou e aceitou pagar os custos dos aluguéis dos moradores.
Hoje a empresa tem um plano de desocupação e paga indenizações a moradores e comerciantes dos bairros atingidos. Também iniciou um processo para fechar as minas e anunciou a paralisação preventiva de extração de sal-gema e fechou sua fábrica em Maceió. Mas isso não parece valer para a Flexal.
No final de julho, a Defesa Civil de Maceió informou, em laudo, que a mineração não causou os danos estruturais na região. Ainda assim, a comunidade deveria ser incluída no programa de desocupação, registrou o jornal Extra de Alagoas no último sábado (30).
Um acordo firmado na Ação Civil Pública dos Moradores e Ação Civil Pública Socioambiental, em agosto de 2021, determina que a empresa incluísse 5.500 imóveis na área de impacto, incluindo a Flexal. Ao todo, são 15 mil imóveis afetados.
A Braskem também deverá pagar ações de reparação urbanística, estabilização e monitoramento de fenômeno geológico, além de um novo planejamento para os bairros afetados.
Mas nada repara a saída forçada de suas casas por risco de segurança. “Perdemos nossa história. Vivemos um luto coletivo não reconhecido”, lamentou o ex-morador do bairro Pinheiro, Alexandre Sampaio ao G1.