Google teria comprado dados bancários secretamente, e essa nem é a pior parte

Em um mundo pós-capitalista que parece muito especificamente projetado para arrancar dos pobres em benefício dos ricos, gastar dinheiro é complicado. Porém, pelo menos até recentemente, você podia viver sem o medo de que alguma empresa multibilionária do Vale do Silício comprasse seus dados bancários para servir anúncios mais efetivos para você. Com base nos […]

Em um mundo pós-capitalista que parece muito especificamente projetado para arrancar dos pobres em benefício dos ricos, gastar dinheiro é complicado. Porém, pelo menos até recentemente, você podia viver sem o medo de que alguma empresa multibilionária do Vale do Silício comprasse seus dados bancários para servir anúncios mais efetivos para você. Com base nos novos detalhes sobre um aparente acordo entre Google e Mastercard, esses dias chegaram ao fim.

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A Bloomberg noticia que, depois de quatro anos de negociações, o Google comprou uma enorme quantidade de dados de transação da Mastercard, supostamente por “milhões de dólares”. O Google então teria usado esses dados para fornecer a anunciantes seletos uma ferramenta chamada “medição de vendas da loja”, que a companhia anunciou bem quietinha em um post de blog no ano passado, embora não tenha mencionado a inclusão dos dados da Mastercard no fluxo de trabalho.

A ferramenta consegue rastrear como anúncios online levam a compras no mundo real, e esses dados extras são projetados para tornar os produtos de anúncios do Google mais atraentes para anunciantes (leia-se: todo mundo ganha mais dinheiro assim). O público não foi informado sobre o suposto acordo da Mastercard, embora anunciantes tenham acesso aos dados de transação há pelo menos um ano, de acordo com a Bloomberg.

Essa é uma grande bomba, quando você para para pensar. Graças, em parte, a uma forte regulação governamental, seu cartão de crédito e seus dados bancários há muito tempo são privados. Se você quisesse gastar US$ 98 na Sephora em uma tarde de terça-feira, essa transação ficava entre você, seu banco e a Sephora. Agora, parece que o Google descobriu uma maneira de achar o caminho até o canal de dados que conecta consumidores e suas compras. Se você clicou em um anúncio da Sephora enquanto estava logado no Google no ano passado e comprou coisas da loja com um Mastercard, existe uma chance de que o Google saiba sobre isso, pelo menos de alguma maneira, e venha servindo anúncios especiais como resultado.

Mas quando você considera tudo o que o Google sabe sobre você, a proposta se torna mais orwelliana. O Google disse ao Gizmodo em um comunicado compartilhado também com a Bloomberg que criptografa e anonimiza os dados de transações com cartão de crédito que está usando com a nova ferramenta de anúncios. Não há como ignorar o fato de que o Google se torna um mecanismo de anúncios mais poderoso e abrangente quando consegue ver detalhes específicos sobre os hábitos de consumo das pessoas, mesmo que eles sejam anonimizados e usados de forma agregada, conforme o Google diz que são os dados da Mastercard. Esse futuro, no qual seu e-mail, seu histórico de pesquisas, suas conexões sociais e agora seus hábitos de consumo são mercadorias, é algo de que devemos ter medo, dizem os defensores da privacidade.

“Confiar em e nomear uma plataforma como a única protetora e guardiã das suas informações é bastante perigoso”, disse Gennie Gephart, da Electronic Frontier Foundation (EFF), em entrevista ao Gizmodo. “Parece-se bastante com ter dispositivos de escuta em sua casa. Isso está trazendo essa tecnologia para mais e mais áreas de nossas vidas que costumavam ser sagradas: a casa, a escola, informações financeiras e informações de saúde.”

Não é que o Google venha usando dados de cartão de crédito para servir anúncios mais efetivos, mas, sim, que ele está fazendo essas coisas em uma escala enorme, e a natureza completa do que está sendo feito está sendo mantida em segredo. O suposto acordo entre Google e Mastercard imediatamente suscitou comparações com a saga recente do Facebook, que estaria se encontrando com bancos para tentar ganhar acesso aos dados financeiros privados dos usuários.

Segundo o Wall Street Journal, a rede social queria informações financeiras detalhadas, como saldos de conta corrente e até transações individuais. Fontes disseram que o Facebook queria construir chatbots para o Messenger para que as pessoas pudessem fazer perguntas bancárias simples a um robô, como seu saldo na conta corrente. Realisticamente falando, o Facebook poderia estar fazendo muito mais com esse tipo de dado.

Como já sabemos por causa da notícia do Google, os anunciantes adorariam saber mais sobre quanto dinheiro você tem e como você o gasta. Um porta-voz do Facebook, no entanto, disse neste mês que a rede social não “usa dados de compra de bancos ou empresas de cartão de crédito para anúncios”. Esse porta-voz também não negou que a empresa teve conversas com bancos para conseguir informações financeiras detalhadas de seus consumidores. O Facebook aparentemente só quer que o mundo saiba que essas conversas, se tiverem acontecido, não indicam atualmente um mecanismo de anúncio orwelliano. Quando pedimos para o Facebook esclarecer essas afirmações, a empresa não respondeu.

Esse mecanismo de anúncios orwelliano existe na nova ferramenta do Google. Considerando todo o segredo em torno do suposto programa de anúncio a partir da parceria com a Mastercard, é difícil saber quais outros gigantes da tecnologia estão fazendo com nossas informações financeiras pessoais. A Amazon certamente sabe muito sobre as coisas que compramos, e descobrimos neste ano que a gigante do varejo online estava explorando a possibilidade de entrar no ramo bancário. O Wall Street Jounal também noticiou que a Amazon, assim como Facebook e Google, conversou com bancos sobre a possibilidade de ter acesso a informações financeiras pessoais.

Não fazemos ideia do que acontecerá daqui em diante. A ideia de que Google, Facebook e Amazon estejam interessados no histórico financeiro e nos hábitos de gastos das pessoas potencialmente levanta comparações com como algumas empresas estão capitalizando em cima do chamado crédito social sendo desenvolvido pelo governo chinês. Essa métrica combina informações sobre a saúde financeira dos cidadãos chineses com dados de outros aspectos de sua vida social, alguns dos quais são coletados por meio de observação do comportamento online.

Não há indicação de que empresas de tecnologia americanas estejam esperando criar algo equivalente, mas o Facebook teria, sim, discutido a possibilidade de incluir dados de redes sociais com as pontuações de crédito nos Estados Unidos ao determinar quem deveria receber empréstimos. O Facebook até mesmo patenteou uma tecnologia que permitiria a bancos analisar os dados de Facebook de uma pessoa quando elas pediam um empréstimo. No fim das contas, o Facebook recuou em sua ideia, embora ainda não esteja claro o que as empresas de tecnologia poderiam fazer com dados financeiros nos bastidores. Sabemos que o Facebook agora tem pontuações de confiabilidade para seus usuários. Talvez alguma espécie de pontuação de crédito social seja a próxima etapa.

As leis são rigorosas”, disse a Dra. Jennifer King, da Centro de Internet e Sociedade da Escola de Direito de Stanford, em entrevista ao Gizmodo. “Mas se você está fazendo algo único ou um sistema como de crédito sem oferecer crédito [uma espécie de ferramenta de pontuação], talvez seja possível que (empresas de tecnologia) possam usar essa informação.”

Portanto, a notícia ruim não é só que o Google está usando dados financeiros para te oferecer anúncios. A notícia pior é que a empresa supostamente tem feito grande parte disso em segredo, e outras empresas de tecnologia, como Facebook e Amazon, estão explorando maneiras de conseguir seus dados bancários também. Talvez a pior notícia, no entanto, seja o que vem pela frente. Parece improvável que sua atividade no Facebook afetará se você consegue uma hipoteca ou não no futuro. Porém, parece possível que o Google saiba não apenas o que você quer comprar agora, mas também o que você fará amanhã, aonde irá, quem você verá.

Dito tudo isso, a boa notícia é que você não precisa usar o Facebook, o Google ou a Amazon. Se o fizer, existem maneiras fáceis de escapar das garras de empresas de tecnologia famintas por dados. Você pode instalar ferramentas como o Privacy Badger para evitar ser seguido pela web por rastreadores invisíveis. Você pode evitar permanecer conectado ao Gmail ou ao Google Chrome. Você pode usar o Firefox no lugar. Você pode cancelar sua assinatura do Amazon Prime. Você pode excluir seu perfil no Facebook. Você pode usar dinheiro quando fizer compras na Sephora. Você pode enrolar seu celular e seu laptop em um saco, amarrar e jogar no rio mais próximo de você.

Imagem do topo: Adam Clark Estes/Gizmodo

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