Um novo estudo é o mais recente a sugerir que a hidroxicloroquina não é uma arma eficaz contra o novo coronavírus, mesmo quando tomado como medicamento preventivo. O estudo randomizado duplo-cego não encontrou nenhuma diferença no risco de contrair o COVID-19 entre os profissionais de saúde que tomaram o medicamento contra malária ou um placebo antes de serem potencialmente expostos ao vírus.
O estudo, publicado no JAMA Internal Medicine, envolvia 125 trabalhadores de saúde que foram randomizados para receber 600 miligramas por dia de hidroxicloroquina ou um placebo por um período de oito semanas. Todos tiveram teste negativo para o coronavírus antes do estudo. Eles foram testados periodicamente para infecção assim que o teste começou, a maioria foi alvo de testes após quatro e oito semanas.
No geral, 6,3% do grupo da hidroxicloroquina foi confirmado como tendo um teste positivo para o coronavírus durante o ensaio, em comparação com 6,6% do grupo do placebo. Essas infecções foram todas leves ou assintomáticas, sem diferenças perceptíveis entre os grupos.
Os resultados foram tão nulos que um conselho independente decidiu encerrar o estudo mais cedo, depois que a maioria, mas não todos os voluntários recrutados, havia feito o trajeto completo de oito semanas de tratamento (200 participantes deveriam participar).
Embora seja possível que deixar o estudo terminar completamente possa ter alterado os resultados, é bastante improvável — dos 125 participantes incluídos na análise do estudo, apenas 22 pararam o tratamento precocemente.
“Por causa disso, não podemos recomendar o uso rotineiro de hidroxicloroquina entre profissionais da saúde para prevenir COVID-19”, escreveram os autores.
Outros estudos negam a eficácia da hidroxicloroquina para tratar COVID-19
Este não é o primeiro ensaio clínico randomizado a lançar dúvidas sobre a hidroxiloroquina como profilático para COVID-19. Em junho, um estudo publicado no NEJM (New England Journal of Medicine) também não encontrou nenhuma diferença nas taxas de infecção entre mais de 800 pessoas que foram recentemente expostas a alguém com COVID-19 confirmado em sua casa ou local de trabalho.
No entanto, esse estudo estava olhando para o potencial de hidroxicloroquina como profilático pós-exposição, semelhante ao que acontece com pessoas que são vacinadas contra raiva por prevenção após serem mordidas por um animal raivoso. Essas últimas descobertas, por outro lado, são as primeiras evidências publicadas de um ensaio clínico testando a droga como uma defesa pré-exposição, de acordo com os autores.
Um estudo observacional — ou seja, uma pesquisa que simplesmente observou o que acontecia com as pessoas em vez de designá-las para receber um medicamento ou um placebo — publicado no Lancet na semana passada descobriu que os pacientes já tomavam hidroxicloroquina para doenças inflamatórias crônicas como artrite reumatóide ou lúpus não tinham menos probabilidade de pegar COVID-19 do que pessoas que não estão tomando a droga.
David Boulware, médico de doenças infecciosas da Universidade de Minnesota e principal autor do artigo do NEJM de junho, disse ao Gizmodo que o pequeno tamanho da amostra do ensaio do JAMA torna difícil tirar quaisquer conclusões sólidas. Mas Boulware observa que ele é co-autor de um estudo semelhante, mas ainda não publicado, de mais de 1.400 profissionais de saúde que também não encontrou nenhum efeito para a hidroxicloroquina como profilaxia pré-exposição (o artigo está passando por revisão de pares, segundo Boulware).
Um pequeno segmento de pessoas e alguns cientistas continuam a propagar os efeitos curativos e protetores da droga para COVID-19. Esta semana, por exemplo, um artigo preliminar foi liberado no site medRxiv que conduziu uma meta-análise de três ensaios clínicos de hidroxicloroquina profilática e afirmou ter encontrado um efeito protetor modesto para a droga. No entanto, todos os ensaios individuais não encontraram nenhum efeito significativo para a medicação.
Boulware, que é coautor em dois dos ensaios incluídos na meta-análise, acredita que poderia ter explicado melhor as peculiaridades dos dados. Um exemplo é que as pessoas em seu estudo que foram designadas para tomar hidroxicloroquina, mas nunca o fizeram, mostraram ter resultados melhores do que qualquer outro grupo. Isso é provavelmente apenas um acaso estatístico aleatório, mas sugere ainda que a hidroxicloroquina não está tendo nenhum efeito real na progressão da doença em pessoas com COVID-19, bom ou ruim. Claro, ele acrescenta, mais dados são necessários para qualquer resposta definitiva.
É possível que a hidroxicloroquina ainda possa ser uma ferramenta valiosa na luta contra COVID-19? Bem, provar uma negativa é sempre muito difícil na ciência. Mas quando você olha para os estudos mais cuidadosamente controlados de hidroxicloroquina até agora — a saber, grande ensaios clínicos randomizados e duplo-cegos —, o medicamento não mostrou eficácia. Boulware observou que há pelo menos um grande ensaio clínico de hidroxicloroquina preventiva ainda em andamento, o ensaio HERO liderado pela Universidade de Duke, com resultados esperados para aparecer nos próximos dois meses.
Os resultados do HERO podem muito bem ser positivos para a hidroxicloroquina. Mas agora, quando a evidência para uma terapia é tão confusa, é mais provável que a droga simplesmente não seja muito útil.
Em meio a uma pandemia ainda mais violenta que ameaça causar novas ondas de infecção, sobretudo na Europa, parece uma perda de tempo de todos continuarem esperando que a hidroxicloroquina de alguma forma se transforme na virada de jogo que já foi prometida.