Treta: Jeff Bezos contesta decisão da Nasa de escolher a SpaceX para missão Artemis

O protesto de 50 páginas mostra que Jeff Bezos e seus parceiros aeroespaciais não vão aceitar a decisão da Nasa sem lutar.
Imagem conceitual da sonda lunar Blue Origin. Crédito: Blue Origin

Na semana passada, a Nasa selecionou a SpaceX, de Elon Musk, em vez de dois outros concorrentes para construir o próximo módulo lunar Artemis. A Blue Origin, fundada pelo CEO da Amazon, Jeff Bezos, agora entrou com um protesto oficial contra a decisão, o que deve intensificar essa rivalidade de longa data.

A Blue Origin apresentou sua reclamação na segunda-feira (26) ao Escritório de Responsabilidade do Governo Federal, uma agência que examina os serviços para o Congresso. O protesto de 50 páginas mostra que Jeff Bezos e seus parceiros aeroespaciais não vão desistir dessa decisão sem lutar.

Em um comunicado enviado por e-mail, a Blue Origin disse que a Nasa “executou uma aquisição falha para o programa Human Landing System e mudou as regras do jogo no último minuto”. Foi uma seleção de “alto risco”, citando as próprias palavras da Nasa, e a decisão “elimina oportunidades de competição, restringe significativamente a base de abastecimento, e não apenas atrasa, mas também coloca em risco o retorno dos EUA à Lua”, de acordo com a empresa. É por essas razões que a Blue Origin apresentou um protesto junto ao Escritório de Responsabilidade do Governo Federal.

A Blue Origin, em parceria com a Lockheed Martin, Northrop Grumman e Draper, estava competindo contra a SpaceX e a Dynetics para construir o próximo sistema de pouso humano da Nasa para as missões Artemis à Lua. Em maio de 2020, a agência espacial concedeu à Blue Origin US$ 579 milhões para levar seu projeto adiante, enquanto a Dynetics recebeu US$ 253 milhões, e a SpaceX, US$ 135 milhões.

A Blue Origin parecia a escolha lógica. A empresa trabalhava independentemente em uma sonda desde 2017; seu design para a sonda parecia sensata e segura (se não excessivamente conservadora); e seus três parceiros da indústria acumularam muita experiência na indústria aeroespacial. Mas a Nasa optou pela SpaceX, concedendo um contrato de US$ 2,9 bilhões para a empresa liderada por Elon Musk.

Para o módulo lunar, a SpaceX usará a Starship, um sistema de lançamento que está sendo testado nas instalações da empresa em Boca Chica, no Texas. Vários protótipos passaram por voos de alta altitude, mas todos os testes até agora terminaram em explosões. A próxima geração de protótipos de nave estelar está agora em desenvolvimento, com o SN15 realizando testes de fogo estáticos na segunda-feira (26) em preparação para outro lançamento de teste de alta altitude.

De acordo com o plano atual, a Nasa enviará dois astronautas — um homem e uma mulher — à superfície lunar em algum momento de 2024. Um foguete do Sistema de Lançamento Espacial (SLS) da Nasa enviará uma cápsula da tripulação Orion ao espaço, enquanto um SpaceX Super Heavy fará o mesmo com a Starship. Após o encontro na órbita lunar, a tripulação entrará na nave espacial e descerá à superfície lunar. A nave então retornará a tripulação à cápsula Orion, que os levará de volta para casa.

Para a Nasa, um objetivo principal — além de pousar astronautas no regolito lunar — é tornar essas viagens sustentáveis e preparar o terreno para uma presença humana permanente na lua. A agência espacial, trabalhando com orçamentos apertados, mantém colaborações com parceiros privados para transformar isso em realidade. O fato de a SpaceX e a Blue Origin estarem envolvidas não é surpreendente: Musk e Bezos têm fortunas gigantescas, e ambos estão obcecados com a ideia de expandir a presença da humanidade no espaço.

Esse desejo mútuo, ao que parece, resultou em uma rivalidade bastante acalorada — uma rivalidade na qual Bezos continuamente se frustra. Em 2013, a SpaceX derrotou a Blue Origin em uma licitação para acessar o Launch Pad 39A da Nasa, e no início deste ano, Bezos, por meio do Projeto Kuiper da Amazon, apresentou uma reclamação sobre o pedido da SpaceX à Comissão Federal de Comunicações para colocar seus satélites Starlink em órbitas inferiores do que o planejado originalmente.

A resposta de Musk ao último protesto é típica do que esperamos do bilionário. “Não consegue colocar em órbita, lol”, ele tuitou em resposta a uma publicação do repórter Kenneth Chang do New York Times. Musk estava se referindo ao fato de que a Blue Origin ainda não colocou um foguete na órbita da Terra, o que é tecnicamente verdade (o New Shepard da Blue Origin faz viagens ao espaço suborbital, e o foguete de dois estágios New Glenn não deve ser lançado até o próximo ano). Não contente em parar por aí, Musk editou uma imagem de uma maquete de sonda lunar da Blue Origin, incluindo as palavras “BLUE BALLS”.

Musk deve se sentir no direito de se gabar assim, dada sua relação aparentemente cômoda com a Nasa. O confiável e reutilizável foguete Falcon 9 está frequentemente entregando carga da agência espacial ao espaço, enquanto seu CrewDragon agora envia astronautas à Estação Espacial Internacional regularmente. A Blue Origin, por outro lado, ainda tem muito a provar — embora seus três parceiros neste projeto de módulo lunar sejam muito confiáveis. Ao mesmo tempo, a solução da SpaceX para o módulo lunar apresenta uma estratégia muito arriscada. A empresa de Musk deve agora provar tecnologias não comprovadas, como reabastecer um foguete no espaço (isso nunca foi feito antes), realizar a aterrissagem vertical de um foguete na superfície lunar (também nunca foi feito antes) e, em seguida, decolar novamente (sim, você já sabe — nunca foi feito antes).

Concepção artística do módulo de pouso da SpaceX na superfície lunar. Imagem: SpaceX

Mesmo assim, a Blue Origin não desiste da luta e a empresa ainda quer participar da Artemis. A empresa está alegando que foi prejudicada pela Nasa e que a agência espacial precisa reconsiderar.

O que é interessante aqui é que a Blue Origin pode realmente sair ganhando.

Durante o processo de licitação, a Nasa indicou sua “intenção de fazer duas concessões”, mas devido a “deficiências percebidas nas dotações orçamentárias futuras disponíveis e previstas”, a agência espacial decidiu ir com um único fornecedor, de acordo com a carta de protesto da Blue Origin. A empresa argumenta que a decisão da Nasa ameaça eliminar a competição e efetivamente impede “o desenvolvimento e lançamento imediato e futuro do sistema de pouso lunar e oportunidades de pouso lunar”.

A Blue Origin está essencialmente afirmando que a decisão da Nasa levará a uma espécie de monopólio no que diz respeito ao desenvolvimento de landers lunares, apesar das alegações da agência espacial de que outros fornecedores serão contratados mais adiante, à medida que o projeto Artemis evoluir.

A Blue Origin estabeleceu o preço de seu lander em US$ 5,99 bilhões, enquanto o custo do lander da SpaceX é menos da metade disso, em US$ 2,91 bilhões. Bob Smith, CEO da Blue Origin, afirma que a Nasa permitiu que a SpaceX renegociasse o preço, mas não ofereceu o mesmo à Blue Origin, relata o New York Times.

A empresa também alega que o processo de seleção foi malfeito, pois a Nasa mudou as regras do jogo no final do processo, “devido à falta de financiamento não revelada e percebida para o ciclo de vida do programa plurianual”, conforme a Blue Origin escreveu em sua carta de protesto, acrescentando que a avaliação da proposta da Blue Origin pela Nasa foi “falha e irracional”.

De fato, em uma declaração, a Nasa havia afirmado que a “proposta da Blue Origin tem mérito e está amplamente alinhada com os objetivos técnicos e de gestão estabelecidos na solicitação”. Apesar disso, a agência espacial não escolheu a Blue Origin para o contrato porque a sua proposta “não apresenta valor suficiente para o governo quando analisada de acordo com os critérios e metodologia de avaliação do edital”.

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A Nasa não está respondendo às solicitações da imprensa sobre o assunto, alegando que “não pode fornecer mais comentários devido a litígios pendentes”.

Dinheiro, como tantas vezes acontece, parece ser o fator decisivo aqui. O Escritório de Responsabilidade do Governo Federal agora levará tudo isso em consideração e decidirá se a Nasa de alguma forma agiu de forma inadequada durante o processo de seleção. A agência tem 100 dias para se pronunciar sobre o assunto. É difícil saber o que vai acontecer daqui pra frente, mas o módulo lunar de Bezos ainda pode ter outra chance.

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