LGPD é adiada pelo Senado por causa do coronavírus
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) deveria entrar em vigor em agosto de 2020. No entanto, por causa da pandemia causada pelo novo coronavírus, o Senado decidiu adiar a aplicação da lei, já que as empresas não teriam tempo de se adequar – por outro lado, algumas entidades se opõem a essa iniciativa.
O projeto de adiamento foi liderado pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, e protocolado pelo senador Antonio Anastasia (PSD-MG), mas ainda precisa passar pela Câmara dos Deputados e pela sanção do presidente Jair Bolsonaro. A iniciativa foi um pedido das empresas que dizem não ter como arcar com os cursos de adaptação.
Com os novos moldes, a LGPD passaria a valer em janeiro de 2021, mas as penalidades só seriam aplicadas a partir de agosto de 2021.
A Folha de S. Paulo aponta que as principais justificativas para o adiamento são que a autoridade reguladora da lei (ANPD) ainda não foi criada na prática e que o caixa das empresas vão sofrer impacto direto na crise, tendo dificuldades para se adaptar à legislação.
Associações do setor de comunicação, ativistas e entidades civis que defendem o direito à privacidade se opõem ao adiamento e lançaram um manifesto por meio da Coalizão Direitos na Rede. Segundo eles, a pandemia coloca uma série de questões sobre o uso de dados de geolocalização e temem que, depois da crise, as regras fiquem mais flexíveis.
Nesta semana, as principais operadoras de telefonia móvel irão oferecer ao MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) dados de locomoção das pessoas para oferecer inteligência na contenção do coronavírus. A Sinditelebrasil, sindicato que representa as operadoras de telecomunicação, diz que os dados serão organizados de forma agregada e anônima “seguindo todas as normas da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e do Marco Civil da Internet.”
A EFF (Electronic Frontier Foundation), entidade norte-americana sem fins lucrativos que defende direitos civis na esfera digital, defende que os governos não deveriam ganhar esses poderes a menos que pudessem mostrar para o público como isso ajudaria no combate à doença, de uma maneira significativa.
Muitas questões rondam a criação do Cadastro Base Cidadão, editado pelo presidente Jair Bolsonaro em 2019. Há uma preocupação que, com o adiamento da LGPD, esse marco ganhe força e represente risco para abuso de poder. O Cadastro Base Cidadão flexibilizou o fluxo de dados no Poder Público, facilitando compartilhamento entre ministérios, sem mecanismos de transparência robustos como os previstos na LGPD, como lembra a Folha.
É um problema difícil de ser resolvido, já que se enquadrar na LGPD pode ser bastante custoso para empresas – em um momento em que o faturamento está caindo, essa dificuldade fica mais evidente. Ao mesmo tempo, o professor de direito digital da FGV, Marcel Leonardi, lembrou à Folha que, graças a crise, as metas fiscais do poder público “foram para o espaço” e que não há orçamento para criar a autoridade responsável por fiscalizar o enquadramento da LGPD.
O manifesto da Coalizão Direitos na Rede toca esse ponto, citando que “própria lei prevê, em seu artigo 55-J, uma aplicação modulada de prazos e procedimentos de adequação direcionados às micro e pequenas empresas e iniciativas empresariais de caráter disruptivo que se declarem startups”.
“Outro ponto importante a respeito das sanções é que a lei também prevê que devem ser considerados (a) a boa-fé ; (b) a condição econômica; e (c) a cooperação do infrator antes da aplicação de advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas”, continua o texto.
Sem a ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), não há aplicação de sanções. Para o grupo, a entrada em vigor da LGPD atua como “como mecanismo de pressão para a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais.”