A história da paleontologia mundial seria outra não fosse as importantes contribuições de Mary Anning. A paleontóloga britânica foi a primeira mulher a provar a existência de dinossauros a partir de registros fósseis. Hoje, a cientista é lembrada no filme Ammonite (2020), mas na época de suas descobertas, era proibida de publicar artigos e teve seu nome excluído de suas próprias pesquisas.
De toda forma, seu pioneirismo entre os séculos 18 e 19 abriu portas no mundo todo — incluindo no Brasil. Por aqui, a primeira mulher a atuar na paleontologia, ainda no século 20, foi, na verdade, uma americana.
Carlotta Joaquina Maury foi uma das primeiras mulheres a seguir carreira científica na indústria de petróleo e gás. Ela nunca pisou em solo brasileiro, mas recebeu diversos materiais paleontológicos do Serviço Geológico do Brasil para analisar. Parte das descrições fósseis e datações feitas pela cientista são válidas até hoje.
Outros grandes nomes viriam depois, como o de Marise Sardenberg. A pesquisadora estudou História Natural na Faculdade de Filosofia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) no final da década de 1960, tornando-se a primeira mulher a realizar pesquisas em paleoictiologia (peixes fósseis).
Sardenberg se dedicava ao gênero Mawsonia, um peixe fóssil que podia atingir até seis metros de comprimento e viveu entre 152 e 96 milhões de anos atrás. O animal, também conhecido como celacanto, nos leva a outra pesquisadora: Marjorie Courtenay-Latimer.
Pesquisadores pensavam que os peixes do gênero estavam extintos há 65 milhões de anos, até que um exemplar vivo apareceu em 1938. Courtenay-Latimer, até então curadora do Museu local de East London, na África do Sul, ficou intrigada com o animal e iniciou seu processo de estudo. Outro cientista classificou o “fóssil vivo” e atribuiu a ele o novo gênero Latimeria.
A brasileira Marise Sardenberg, ainda em início de carreira, foi estudar peixes fósseis no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), atual Agência Nacional de Mineração (ANM). Dos 8 grandes paleontólogos que trabalhavam no órgão, quatro eram mulheres.
Eram elas Maria Eugênia de Carvalho Marchesini Santos (invertebrados fósseis), Nicéa Magessi Trindade (megásporos fósseis), Lélia Duarte da Silva Santos (paleobotânica) e Norma Cruz (microfósseis). As três primeiras estariam envolvidas na fundação da Sociedade Brasileira de Paleontologia, em 1958.
“Essas primeiras mulheres vieram todas egressas da Faculdade Nacional de Filosofia (atual UFRJ) e mais ligadas ao Magistério, mas acabaram lutando para atuar, também, em pesquisas com o apoio, na época, do Conselho Nacional de Pesquisas, que fornecia as bolsas para o início dos seus trabalhos. Havia poucas mulheres no curso de Geologia, considerado um curso majoritariamente masculino. Essa mudança começou a ocorrer a partir da década de 60”, explica Marise.
Apesar dos esforços, as mulheres ainda enfrentam dificuldades na ciência. Elas representam 54% dos estudantes de doutorado no Brasil, mas apenas 24% delas recebem as chamadas bolsas produtividade do governo. Além disso, as mulheres cientistas representam meros 14% da Academia Brasileira de Ciências.
A partir do dia 12 de maio, o Museu de Ciências da Terra (MCTer), no Rio de Janeiro, irá receber uma exposição sobre Carlotta Joaquina Maury. Na inauguração, será feito um evento semipresencial no Salão Nobre do Serviço Geológico do Brasil abordando a equidade de gênero das geociências, o que inclui a paleontologia. A Associação Brasileira de Geocientistas (ABMGEO), a rede Geomamas e o movimento Woman in Minning Brasil estarão presentes na discussão.