Descoberta de objeto distante no Sistema Solar reforça hipótese da existência do Planeta Nove

Astrônomos descobriram um objeto, batizado de “o Goblin”, nos limites extremos de nosso Sistema Solar. O planeta anão nunca chega mais perto do Sol do que 9,7 milhões de quilômetros, mas os especialistas dizem que sua configuração aponta para a existência de um planeta maior e mais distante, o evasivo Planeta Nove. • Quando vamos encontrar […]

Astrônomos descobriram um objeto, batizado de “o Goblin”, nos limites extremos de nosso Sistema Solar. O planeta anão nunca chega mais perto do Sol do que 9,7 milhões de quilômetros, mas os especialistas dizem que sua configuração aponta para a existência de um planeta maior e mais distante, o evasivo Planeta Nove.

• Quando vamos encontrar o Planeta Nove?
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O Goblin, ou o 2015 TG387, como é formalmente chamado, é conhecido como um objeto transnetuniano extremo, ou ETNO, na sigla em inglês. Como o próprio nome diz, estes objetos — potencialmente, milhares deles — estão localizados bem além da órbita de Netuno. A existência do Goblin só não é mais notável que o fato de ele ter sido detectado por astrônomos.

Os pesquisadores que descobriram o objeto — uma equipe liderada por Scott Sheppard, do Instituto Carnegie para Ciência, e Chadwick Trujillo, da Universidade do Arizona do Norte — estimam que o Goblin tem cerca de 380 quilômetros de diâmetro. Com este tamanho, ele pode muito bem ter uma forma esférica. Sua distância média do Sol é de cerca de 80 unidades astronômicas (UA), em que 1 UA é a distância média da Terra até o Sol. Isto é cerca de 12 bilhões de quilômetros.

Diagrama mostrando a órbita de Goblin em relação a outros objetos do Sistema Solar. O novo planeta anão une Sedna e VP113 de 2012 como os únicos três objetos conhecidos da Nuvem de Oort Interior.

Para efeito de comparação, Plutão está a 34 UA do Sol. O Goblin, portanto, está cerca de 2,5 vezes mais longe. Sim, isso é muita cosia.

Mas a coisa ainda vai mais longe, pois o Goblin tem uma órbita super-alongada. Leva cerca de 40 mil anos para este ETNO completar um ciclo em volta do Sol, mas ele nunca chega mais perto do que 65 UA — este é seu periélio. Dois outros ETNOs conhecidos, o 2012 VP113 (também descoberto por Sheppard e Trujillo) e Sedna têm periélios mais distantes, a 80 AU e 76 AU, respectivamente. O Goblin agora possui o terceiro periélio mais distante conhecido. Só que seu afélio, o ponto mais distante do Sol, é impressionante: 2.300 AU. Isso dá 503 bilhões de quilômetros.

A órbita extrema do Goblin significa que ele nunca chega perto o suficiente para exercer influência gravitacional nos planetas gigantes do Sistema Solar, como Netuno ou Jupiter. E, a uma distância espantosa de 2.300 AU, ele se encaixa em uma categoria astronômica emergente, conhecida como objetos do Nuvem de Oort Interior (IOCs, na sigla em inglês). Até agora, o 2012 VP113 e o Sedna são os dois únicos membros conhecidos dessa categoria.

Imagens telescópicas de dois quadros mostrando Goblin se movendo pelo céu. GIF: Carnegie Mellon

“Nós acreditamos que deve haver milhares de pequenos corpos como o 2015 TG387 nas margens do Sistema Solar, mas a distância torna muito difícil descobri-los”, diz David Tholen, astrônomo da Universidade do Havaí e co-autor do novo estudo, em um comunicado. “Atualmente, somos capazes de detectar o 2015 TG387 somente quando ele está no seu ponto mais próximo do Sol. Em algo em torno de 99% de sua órbita de 40 mil anos, ele seria muito fraco para ser visto.”

Mike Brown, astrônomo do Instituto de Tecnologia da Califórnia e que não participou do estudo, diz que é importante entender que isso não é a Nuvem de Oort, que fica muito mais longe, começando entre 2.000 AU e 5.000 AU e chegando até mesmo a 50.000 AU.

“Eles dizem que este corpo é parte da ‘Nuvem de Oort Interior’, mas eu sinto que este provavelmente não é o termo correto”, diz Brown ao Gizmodo. “Nós ainda não encontramos a maneira correta de descrever estes objetos muito distantes. Mas a chave é que eles são muito distantes que nunca chegam perto nem mesmo de Netuno. Basicamente, há apenas outros dois objetos como este conhecidos até o momento. Portanto, acrescentar mais um aumenta enormemente nossa compreensão dessa população.”

Perspectiva do sistema solar, planetas (obviamente) não escalar.

O Goblin foi visto pela primeira vez em outubro de 2015, no telescópio japonês Subaru, que tem 8 metros e fica no topo do vulcão extinto Mauna Kea, no Havaí, Foram anos de observações até a confirmação de sua verdadeira identidade. Os pesquisadores precisaram realizar medições precisas de sua órbita — o que não é uma tarefa fácil, já que ele se move de maneira muito lenta e seu período orbital é bastante prolongado. As medições realizadas entre 2015 e 2018 pelo telescópio Magellan, no Observatório de Las Campanas, do Carnegie, que fica no Chile, ajudou a determinar e confirmar a configuração orbital do Goblin.

A descoberta do 2015 TG387 reforça a hipótese do Planeta Nove — um planeta hipotético, às vezes referido como Planeta X. Ele seria muitas vezes maior que a Terra e estaria localizado a centenas de unidades astronômicas de distância. Como nota o novo estudo, publicado ontem no The Astronomical Journal, a localização do periélio do Goblin é semelhante ao que foi observado com o Sedna e com o 2012 VP113, entre outros ETNOs. Isto é uma pista para os astrônomos de que alguma coisa potencialmente grande — isto é, uma super-Terra — está empurrando estes objetos em órbitas muito semelhantes.

“Estes objetos distantes são como migalhas que nos levam ao Planeta Nove”, diz Sheppard. “Quanto mais encontramos, melhor podemos entender as partes mais distantes do Sistema Solar e o possível planeta que acreditamos estar moldando suas órbitas. Esta descoberta redefiniria nosso conhecimento sobre a evolução do Sistema Solar.”

Com a ajuda de Nathan Kaib, da Universidade de Oklahoma, um dos coautores do estudo, os pesquisadores fizeram várias simulações computadorizadas. Na maior parte os casos, o hipotético Planeta Nove previnia o Goblin de chegar muito perto — um efeito conhecido como pastoreio gravitacional. Este efeito pode, potencialmente, explicar por que outros ETNOs têm órbitas semelhantes.

Os astrônomos da Caltech Konstantin Batygin e Mike Brown propuseram a existência do Planeta Nove em 2016. Quando perguntados se o novo estudo reforça o argumento, Batygin diz “absolutamente”.

“As órbitas de objetos de longo período do Cinturão de Kuiper estão agrupadas no espaço”, diz Batygin, que não participou do novo estudo, ao Gizmodo. “Este agrupamento adicional só pode ser mantido se o Sistema Solar hospedar um planeta adicional — ainda não visto — como uma super-Terra. Este objeto ficaria no meio do agrupamento, e acrescenta outros dados que apontam para a existência do Planeta Nove.”

O astrônomo Carlos de la Fuente Marcos, da Universidade Complutense de Madrid, não filiado ao novo estudo, disse que o artigo e que a pesquisa são o “estado da arte” e que as conclusões são “sonoras e robustas”. Ele também concorda que a descoberta dá credibilidade à existência do Planeta Nove.

“O 2015 TG387 mal interage com os outros planetas conhecidos. Mesmo assim, sua órbita é muito alongada”, diz Marcos ao Gizmodo. “Os processos de formação planetária são incapazes de produzir, por si, órbitas muito excêntricas. Acredita-se que região que este novo objeto atravessa esteja desprovida de grandes perturbadores, como planetas, e mesmo assim o objeto está segundo esta órbita muito alongada.”

Poucas alternativas são possíveis, diz Marcos. Ou o Goblin foi arremessado em sua trajetória orbital atual por alguma coisa que aconteceu durante a formação do Sistema Solar, ou ele atingiu sua órbita atual como resultado de uma interação mais recente com um planeta ainda a ser observado, isto é, o Planeta Nove.”

Daniel Brown, astrofísico da Universidade Nottingham Trent, disse que os autores apresentaram uma “hipótese convincente” no geral. Ele está particularmente animado com a descoberta de um terceiro objeto da Nuvem de Oort Interior. Brown gostou de como as simulações dos pesquisadores levaram em consideração vários efeitos gravitacionais que “poderiam impactar a movimentação destes IOCs” ao mesmo tempo que aponta como “um hipotético Planeta Nove poderia estabilizar a órbita deste novo objeto e influenciar seu comportamento.”

Entretanto, Brown diz que alguns efeitos gravitacionais incluem encontros aleatórios com estrelas próximas. Por sua natureza, seus padrões são imprevisíveis.

“Nós conhecemos um possível comportamento médio, mas isso não é suficiente para prever seu impacto em apenas alguns objetos. Dados de muitos outros objetos da Nuvem de Oort Interior seriam necessários para explorar o impacto dos encontros estelares”, diz Brown ao Gizmodo. “Além disso, esses objetos foram encontrados em uma região prevista pela órbita proposta do Planeta Nove. Logo, a descoberta deles é levemente enganosa, o que podemos chamar de enviesada. Uma pesquisa que busque por IOCs em todas as direções igualmente lançaria mais luz sobre a questão.”

Dadas as extremas distâncias envolvidas, entretanto, Brown admite que a descoberta apresenta uma proposta muito desafiadora.

Com a confirmação da existência do 2015 TG387, nós podemos começar a imaginar uma missão para essa rocha distante. Quando perguntado se deveríamos visitar Goblin, Brown afirma que não há absolutamente nenhum motivo para enviar uma sonda. Como objeto isolado, diz o cientista, o objeto é desinteressante e sua importância “é mais o que ele diz sobre as forças gravitacionais que nos cercam e menos ele mesmo”.

Outros astrônomos com quem conversamos, entretanto, consideram que uma missão a Goblin seria uma boa ideia. Eles admitem, porém, que seria um grande desafio logístico, dadas as distâncias extremas envolvidas. A sonda New Horizon, por exemplo, vai visitar o objeto Ultima Thule, chamada oficialmente de MU69, que fica no Cinturão de Kuiper, com chegada marcada para 1º de janeiro de 2019. Este objeto está entre 40 e 50 vezes mais distante do que a Terra está do Sol. Para alcançá-lo, a sonda está viajando desde 2006. Para chegar ao Goblin ou ao proposto Planeta Nove, seria preciso uma viagem quatro a cinco vezes maior, ou ainda mais.

Se conseguirmos isso, entretanto, Daniel Brown diz que podemos descobrir sobre a composição química e estrutural desses objetos, o que daria uma “compreensão ainda melhor sobre a formação do nosso Sistema Solar”. E, caso consigamos visitar o Planeta Nove, isso mudaria a nossa concepção de como os planetas são, o que nos ajudaria a entender a estrutura do Sistema Solar.

Mas calma, vamos começar do começo: primeiro, nós precisamos encontrar o Planeta Nove. Se é que ele existe.

[The Astronomical Journal]

Imagem do topo: Concepção artística do hipotético Planeta Nove, às vezes referido como Planeta X. A descoberta de um novo planeta anão nos confins do Sistema Solar está fornecendo evidências adicionais de sua existência.

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