Roupas mostram que mulheres vikings tinham um poder tremendo
Diferente das donzelas, escravas ou guerreiras retratadas na cultura pop, as mulheres vikings tinham mais poder do que o censo comum imagina. E tudo por motivos econômicos: como eram tecelãs, as roupas que faziam ganhavam o mesmo peso que a prata, a principal moeda da época.
A constatação está em uma pesquisa da arqueóloga antropológica Michèle Hayeur Smith, da Universidade de Brown, nos EUA. A principal conclusão é que os vikings nunca teriam expandido seus territórios ou sido conhecidos sem o trabalho de tecelagem das mulheres.
A Era Viking começa em 790, no século 8, e vai até o século 11. O povo habitava o norte da Europa, mais precisamente na região onde hoje é a Noruega, Suécia e Dinamarca.
A pesquisa de Smith identificou uma série de detalhes sobre os vikings através de pequenos fragmentos de tecidos mais resistentes ao passar do tempo – as tramas se decompõem facilmente, exceto em condições específicas de preservação.
Smith recorreu ao que sobrou de tecidos antigos para entender como era a vida das mulheres vikings nas primeiras sociedades do Atlântico Norte – e encontrou muita coisa. As amostras datam do ano 874 e teriam saído de um assentamento viking da Islândia.
“Os têxteis e o que as mulheres faziam eram tão essenciais quanto a caça, a construção de casas e as lutas pelo poder”, disse a pesquisadora à revista Scientific American.
Tanto na era viking quanto na Idade Média, as mulheres eram administradoras e se dedicavam ao comércio desses agasalhos – especialmente porque os homens viviam em incursões ou expedições comerciais.
Mais que isso, elas também detinham a base da economia do Atlântico Norte, já que suas roupas permitiam que todos se protegessem do frio. E elas sabiam disso. Para lucrar mais, criaram um padrão de vestimenta baseado na lã caseira.
Comércio rudimentar (e lucrativo)
Até o final da era viking, por volta de 1.060, certas mercadorias, como tecidos, vacas e grãos recebiam um valor baseado no equivalente em prata. Depois disso, porém, o tecido vadmál – lã tecida no padrão ZS – parece ter se tornado mais importante.
A pesquisa indica que alguns motivos podem ter contribuído para isso: escassez de prata depois que os vikings pararam de atacar, crescimento populacional e o aumento da produção de lã das tecelãs.
Foi então que os tecidos, produzidos em enormes quantidades à época, se tornaram não mais mercadorias, apenas, mas uma espécie de moeda. As roupas passaram a pagar impostos e servir na troca de alimentos, por exemplo.
Isso se tornou especialmente comum na Inglaterra, que produzia seus próprios tecidos de luxo – mas ainda precisava de tecidos baratos e duráveis para vestir camponeses, pobres e soldados. E isso vinha das mulheres vikings.
“Todo mundo assumiu que a economia era uma coisa masculina”, disse Smith. “Na verdade, não eram os homens, mas as mulheres que tomavam as decisões”.
Isso fica claro nos registros legais da época. Havia especificações muito claras do que era o vadmál e quanto deveria ser cobrado a cada tamanho do tecido. “É difícil saber se as mulheres criaram as especificações ou colaboraram com os homens para fazê-lo”, explica a pesquisadora.
“Mas fica claro, ao olhar para o tempo envolvido e as ferramentas, que todas as mulheres estavam envolvidas na produção. Os homens até podem ter controlado grande parte da narrativa dessas leis, mas é difícil que eles tenham feito isso pois não chegavam nem perto de tecer”, apontou.
Mudanças de poder
Eventualmente, o mundo mudou. Por volta de 1450, o Reino da Noruega e colônia da Groenlândia Nórdica foram destruídos pela peste e agitação política e as mulheres perderam o poder que construíram com a fabricação de tecidos.
Em 1603, o rei Cristiano IV, da Dinamarca, impôs um monopólio real sobre o comércio e a Islândia perdeu a liberdade no setor. Até essa época, o país continua usando o vadmál como moeda e mantinha a exportação. Mas desde o século 14, o peixe havia se tornado o produto de maior valor.
E a Revolução Industrial, mais tarde, encerrou de vez o tear das descendentes vikings. “Essa época selou o destino das mulheres como cidadãs de segunda classe e garantiu que a sociedade ocidental se tornasse tão veementemente patriarcal”, pontuou Smith.