Vacina brasileira que imuniza contra HIV será testada em macacos, mas tem longo caminho a percorrer
Estamos cada vez mais próximos de encontrar uma cura para o HIV, causador da Aids: este ano, um bebê e 14 adultos se livraram do vírus usando antirretrovirais. Mas imagine se, tomando uma vacina, você pudesse ficar imune ao HIV? É isto que pesquisadores brasileiros querem tornar realidade.
Até o final do ano, uma vacina brasileira contra o HIV começará a ser testada em macacos. Chamada de HIVBr18, ela foi desenvolvida e patenteada por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo). O objetivo dos testes, que durarão 24 meses, é descobrir a melhor forma de imunizar humanos contra o vírus.
Segundo a Agência Fapesp, os testes serão feitos em primatas por dois motivos: eles têm sistema imunológico semelhante ao dos humanos; e eles são vulneráveis ao SIV, vírus que causa a Aids símia e que deu origem ao HIV.
A vacina é bem promissora. Uma versão anterior da HIVBr18 já foi testada em camundongos, e com bons resultados. Em estudo ainda não publicado, o grupo que recebeu a vacina tinha 50 vezes menos vírus que o grupo controle.
Os cientistas acreditam que, por enquanto, a vacina não eliminaria totalmente o HIV do corpo, mas poderia reduzir tanto sua presença que a pessoa infectada não teria Aids nem transmitiria o vírus. Ela poderia até fortalecer o efeito de outras vacinas contra a Aids, como a desenvolvida por um grupo da Rockefeller University (EUA).
Quando?
E quando a vacina chegará aos humanos? Não tão cedo. Depois que terminar o teste com macacos, provavelmente em 2015, começam os testes clínicos. Na fase 1, a vacina será testada em pessoas saudáveis e com baixo risco de contrair o HIV; elas serão acompanhadas de perto por vários anos. Se tudo correr como esperado, então começa a fase 2, com pessoas já infectadas pelo vírus, para avaliar se o tratamento funciona, e qual a dose adequada.
Então chegamos à fase 3, a mais demorada: é um estudo com um grupo maior de pessoas, para avaliar a significância estatística do tratamento – isto é, se a vacina causa diferença real ente o grupo testado e o grupo controle. Essa fase é necessária para começar a vender a vacina.
Mas tudo isso é muito caro: o custo estimado das três fases é de R$ 250 milhões. Por enquanto, o projeto recebeu R$ 1 milhão em financiamento, vindos da Fapesp e do governo federal.
Como funciona?
Os cientistas acreditam que tudo depende de ativar um tipo especial de célula: a TCD4 citotóxica. Este glóbulo branco, mesmo sob ataque do HIV, parece manter sob controle a quantidade do vírus no sangue. Ativar esse tipo de célula pode ser a chave para a cura.
Em 2010, cientistas modificaram a genética de alguns camundongos: dessa forma, eles começaram a produzir moléculas do sistema imunológico humano. Então os pesquisadores injetaram pedaços de proteínas do HIV, escolhidos a dedo em estudo anterior – nos humanos, eles ativam as células TCD4. O resultado: mesmo nesses camundongos, os pedaços de HIV ativaram as células TCD4.
Se o organismo consegue identificar o HIV antes que ele cause estragos, será que ele consegue combatê-lo? Parece que sim. A vacina criada no estudo induziu respostas imunes contra os pedaços do vírus. E o mais incrível: eram 16 tipos diferentes de fragmentos. Isso sugere que uma só vacina poderia ser criada para os diferentes tipos de HIV no mundo.
A vacina HIVBr18 foi criada por Edecio Cunha Neto, Jorge Kalil e Simone Fonseca, pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). O projeto é conduzido no Instituto de Investigação em Imunologia, e apoiado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e pela Fapesp. E, em alguns anos, ele pode enfim nos levar à imunização do HIV. [Agência Fapesp]
Foto por ZaldyImg/Flickr