Por que bandidos não usariam uma maquininha de cartão para assaltar você
Nesta terça-feira (24), um telejornal da Rede Globo noticiou que um rapaz foi assaltado em Ribeirão Preto (SP) de uma forma inesperada: o bandido teria usado uma máquina de cartão para roubá-lo porque ele não tinha dinheiro vivo. Claro que era mentira.
Hoje, um advogado explicou ao jornal Hora 1 que a “vítima” inventou a história para a polícia porque queria evitar uma bronca do pai.
O advogado diz que, na verdade, seu cliente de 25 anos ficou com vergonha de contar para o pai que foi extorquido por uma garota de programa.
Ele estava em um motel de Ribeirão, desistiu do programa e foi ameaçado. No dia seguinte, o rapaz inventou uma história absurda: disse que foi rendido por três assaltantes e levado para um galpão. Como ele estava sem dinheiro, os bandidos teriam passado o cartão de crédito dele três vezes, para roubar um total de R$ 351.
Nós suspeitávamos que a história era falsa, então entramos em contato com a Cielo e a Rede, as duas maiores empresas de máquina de cartão no Brasil.
A Cielo explica ao Gizmodo Brasil que, em qualquer transação com cartão, é possível rastrear todo o processo. Por isso, forçar alguém a pagar com cartão não é uma boa ideia. Mesmo que o portador do cartão fosse coagido a fazer o pagamento, um criminoso que utilizasse a máquina para receber o valor da transação deixaria um rastro bem visível sobre a destinação do valor – no caso, a conta corrente e o CPF ou CNPJ associado à máquina.
Como funciona o processo de pagamento? Há uma cadeia de relações entre a credenciadora, o banco emissor do cartão e a bandeira do cartão. Um documento da Cielo explica:
– tudo começa na máquina de cartões, equipada com um chip de telefonia móvel ou conectada a uma linha telefônica ou de internet. Ela envia o pedido para uma central de processamento da credenciadora (Cielo, Rede etc.).
– a credenciadora encaminha os dados do cartão e os detalhes da transação para a bandeira (Visa, Mastercard etc.), que identifica quem é o emissor do cartão – em geral um banco – e o informa sobre o pagamento.
– ao ser comunicado pela bandeira, o banco verifica se o cartão é válido e se o portador tem limite de crédito suficiente. Aí a transação é autorizada (ou negada). Não há movimentação financeira até aqui.
– então, a transação faz o caminho de volta. O banco envia a informação para a credenciadora, que liquida a transação e informa ao banco do dono da maquininha, que credita o valor da venda na conta.
Toda transação é analisada por uma inteligência artificial para detectar fraudes. Por exemplo, se um restaurante transaciona R$ 5.000 por dia, e em certa data passa a R$ 50.000, o sistema gera um alerta para o banco emissor do cartão, que entra em contato com o cliente para checar se a transação é verdadeira.
Na Cielo, o valor é depositado após um dia útil nas transações em débito, e até 31 dias depois se for crédito. O site da Rede explica que seus prazos são os mesmos. (A assessoria da Rede não nos respondeu até o momento.)
Ou seja, um possível roubo por maquininha de cartão seria facilmente rastreável, absurdo demais para ser verdade – e era mentira, mesmo.
O rapaz voltou à delegacia de Ribeirão Preto para retificar o boletim de ocorrência, e pode responder por falsa comunicação de crime.
Foto por Institute for Money, Technology and Financial Inclusion/Flickr