As primeiras descobertas genéticas da NASA após analisar dois astronautas gêmeos
Muita gente sonha com o dia em que viajaremos para Marte. Mas antes que nós, terráqueos, nos juntemos a uma jornada de sete meses ao Planeta Vermelho, precisamos entender como as difíceis condições do espaço podem afetar nossos corpos.
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Ainda bem que os astronautas Scott e Mark Kelly se voluntariaram, de boa vontade, como cobaias para a NASA, que tem estudado a dupla desde que retornaram de suas respectivas viagens ao espaço: os gêmeos idênticos são o objeto de uma investigação de dez partes para entender o impacto da viagem espacial no corpo humano. Os pesquisadores coletaram amostras de sangue e outros materiais biológicos enquanto os gêmeos estavam tanto na Terra quanto em órbita. Agora, estão comparando-os para o apropriadamente batizado Estudo dos Gêmeos.
Embora os resultados completos do Estudo dos Gêmeos provavelmente não devam ser publicados por mais um ou dois anos, as primeiras descobertas já chegaram. Amostras coletadas antes, durante e depois da missão mais recente de Scott Kelly — em que ele passou 340 dias no espaço — “revelaram alterações na expressão genética, na metilação do DNA e em outros marcadores biológicos”, noticiou a Nature. De acordo com a equipe de cientistas que conduz o estudo, essas mudanças “provavelmente são atribuíveis” à longa estadia de Scott no espaço. O grupo apresentou suas descobertas preliminares em 26 de janeiro, em reunião com cientistas que trabalham no Programa de Pesquisas Humanas da Nasa, em Galveston, no Texas.
“O mais importante do estudo é mostrar que somos capazes de fazê-lo”, afirmou Andrew Feinberg, geneticista da Johns Hopkins University School of Medicine, em Baltimore. “Acho que as pessoas não haviam percebido que seria tão fácil fazer genômica nos astronautas no espaço.”
Embora “fácil” seja uma maneira discutível de se descrever esses testes, eles definitivamente são aprofundados e reveladores.
Como gêmeos idênticos, os irmãos são geneticamente muito similares. Entretanto, pesquisadores descobriram que, enquanto Scott esteve em órbita, seus telômeros — as tampas nas extremidades dos cromossomos — cresceram mais do que os de seu irmão. Embora os telômeros de Scott tenham retornado ao seu tamanho anterior à viagem pouco após o retorno do astronauta para a Terra, esses resultados foram completamente inesperados, já que telômeros normalmente encolhem ao longo da vida de uma pessoa, e o estresse do voo espacial teoricamente deveria acelerar isso. Pelo menos essa era a ideia.
“Isso é exatamente o oposto do que pensávamos”, disse Susan Bailey, bióloga de radiação na Colorado State University, à Nature.
John Charles, cientista-chefe do Programa de Pesquisas Humanas da Nasa, afirmou que os cientistas estão interessados no comprimento do telômero durante a viagem espacial porque sua erosão poderia causar problemas de saúde durante missões de longa duração. É crítico entender esses potenciais riscos de saúde antes de enviar astronautas a longas viagens, como para Marte.
Embora os telômeros de Scott tenha milagrosamente se alongado, isso ainda vale revisão. “É importante apreciar que o alongamento do telômero nem sempre é algo bom, já que pode ser associado a processos de alguma doença ou a patologias. Porém, não é o caso, neste exemplo”, Charles contou ao Gizmodo.
Outro mistério nos resultados envolve a metilação do DNA — processo em que grupos metilos são acrescentados às moléculas de DNA para controlar a expressão genética. Os pesquisadores descobriram que esse processo diminuía enquanto Scott estava em órbita, mas aumentavam em Mark durante o mesmo espaço de tempo.
“A metilação é como o gene desliga seções das quais não precisa de cópias”, contou Charles. “Medir mudanças na metilação é uma maneira de documentar o quão ativo um gene é em diferentes circunstância e de determinar que seções do gene não estão sendo lidas e transcritas pelo fato de o corpo não precisar das proteínas codificadas nessas seções. Essas medidas ajudam a entender como o corpo responde a fatores da viagem espacial, a nível de gene.”
Os cientistas observaram mudanças mais dramáticas na expressão genética de Scott, que passou mais tempo no espaço (520 dias) do que na de seu irmão. Essas alteração podem ser atribuídas às condições rigorosas (como se alimentar de comida congelada, mudar os padrões de sono e se expor à microgravidade). Agora, os pesquisadores voltarão sua atenção para determinar o que exatamente está causando as mudanças moleculares.
“Se os Kelly não tivessem sido selecionados como astronautas, a NASA poderia ainda estar em um caminho mais lento de abraçar a pesquisa genômica”, disse Charles.
Descobrir como o corpo humano responde a viagens espaciais de longo prazo é muito trabalhoso, mas alguém tem que fazer isso. Especialmente se quisermos ter aquela colônia de gatos em Marte com que eu tenho sonhado.
[Nature]
Imagem do topo: NASA