Por que o Facebook pagou US$ 2 bilhões pelo Oculus Rift, o futuro da realidade virtual
A Oculus é a criadora da melhor experiência em realidade virtual que já vimos. Ontem, o Facebook comprou a empresa por US$ 2 bilhões. Isso deixou todos surpresos, e alguns ficaram revoltados. No entanto, mesmo que você tema pelo futuro do Oculus Rift, esta pode ser a melhor coisa que já aconteceu para esta promissora tecnologia.
O Oculus Rift começou como um projeto financiado pelo Kickstarter, e a empresa tem toda uma aura de startup e inovação. O Facebook, por outro lado, está com a imagem cansada: há quem esteja de saco cheio da rede social, e não quer vê-los pôr as mãos em algo tão bacana quanto o Oculus Rift ou o WhatsApp. Ou o Instagram.
Mas por que a aquisição seria boa para a Oculus? Ora, não dá para ir muito longe em financiamento usando só o Kickstarter. E ela vai precisar de dinheiro: a Sony já mostrou o Project Morpheus, seu óculos de realidade virtual; enquanto a Microsoft também está trabalhando em fazer o mesmo.
Além disso, o Facebook oferece recursos financeiros para tornar o Oculus Rift um produto verdadeiramente de massa, indo além de jogos. E ainda melhor: parece que Mark Zuckerberg entende o que faz o Oculus Rift ser tão especial.
Além dos jogos
Vimos o Oculus Rift fazer muitas coisas incríveis. Ele pode levar você para o universo de Game of Thrones, ou encantar uma avó de 90 anos com imagens de Toscana, Itália. Bacana, né? Mas também limitante. A realidade virtual tem sido historicamente aplicada a jogos, mas ela pode ir muito além. E o Facebook entende isso.
Deixada à própria sorte, a Oculus poderia fornecer uma forma de jogar Left for Dead 2 da forma mais imersiva possível. E há valor nisso! Mas e se ele estiver presente em hospitais, salas de aula, cozinhas, navios de guerra e outros? O Facebook pode dar ao Oculus todas as chances de realizar o seu potencial.
Mark Zuckerberg, ao discutir a aquisição, disse mais de uma vez que a sua empresa está se preparando para “as plataformas de amanhã”. É isso que o Oculus Rift fornece: a plataforma. Um lugar para jogos, com certeza, mas também para bate-papo, educação, e literalmente tudo o que envolve interação humana.
Parece inverossímil que um headset estranho consiga esse tipo de onipresença, não? Mas lembre-se que Android e iOS não existiam há 10 anos, e agora eles estão por todo lado.
Pense nisso desta maneira. Sem o Facebook, o melhor cenário do Oculus seria tornar-se um produto real que os jogadores poderiam adotar… até o Projeto Morpheus da Sony ser lançado. Algo ótimo, mas de nicho. Com o Facebook, o Oculus poderá estar à venda em breve. E quando isso acontecer, ele terá mais recursos para expandi-lo além dos games.
Por que comprar a Oculus
O Facebook não comprou o Instagram, WhatsApp e Oculus para transformá-los na rede social que eles já têm. Ela os comprou torcendo que uma delas seja tão bem-sucedida como a rede social. Como disse Bill Gates sobre Mark Zuckerberg, ele “quer que o Facebook seja o próximo Facebook”.
Afinal, a estratégia mais sensata para Zuck é diversificar. O modelo de negócios é arriscado – basicamente, a empresa vive de propagandas – e eles não podem confiar que o Facebook durará para sempre.
É se diversificando que grandes empresas deram certo. O Google depende bastante de propagandas, mas avançou em áreas como navegadores web, smartphones, computação vestível e até carros autônomos. A Apple era uma empresa de computadores, que se reinventou apostando em música, smartphones e tablets. Por que o Facebook não faria algo semelhante?
A empresa, então, aproveita para fazer aquisições sem gastar muito dinheiro vivo. O Instagram, por exemplo, foi adquirido por US$ 300 milhões em dinheiro vivo mais US$ 700 milhões em ações. No caso do WhatsApp, “só” US$ 4 bi foram em dinheiro; o restante são ações da rede social. No caso do Oculus VR, a história se repete: US$ 400 milhões em dinheiro, e o resto em ações.
Vai sobreviver?
Há motivos para se preocupar com a venda da Oculus? Claro que sim. E esta é a maior preocupação: será que ela vai desaparecer e morrer?
É uma pergunta sensata. Os produtos que o Google compra geralmente são fechados ou abandonados – como o Sparrow, que não recebe atualização há meses. O Yahoo! comprou muitas coisas, mas passou muito tempo sem cuidar direito delas – como o Flickr – ou simplesmente desistiu delas e as fechou – caso do antigo Geocities. (O Tumblr também está passando por mudanças após a aquisição.)
Mas o Facebook, até agora, parece deixar suas aquisições caminharem de forma independente. O Instagram está cada vez mais forte, por exemplo. A equipe do Branch, serviço adquirido este ano por US$ 15 milhões, ainda mantém o site na ativa. E a compra do WhatsApp só aconteceu porque o Facebook prometeu deixá-lo agir como uma empresa independente – o Google teria oferecido US$ 20 bilhões, mas o CEO Jan Koum teria recusado.
Além disso, como o Facebook iria incorporar uma empresa de hardware à rede social? É uma ideia ridícula pensar que eles gastaram US$ 2 bilhões para criar, por exemplo, uma realidade virtual do seu feed de notícias. Quando eles dizem que a Oculus continuará independente, e que seu principal objetivo é ter sucesso como plataforma, há todas as razões para acreditar que isso é verdade.
Futuro após a aquisição
Uma preocupação mais racional, porém, é que a experiência final do Oculus estará sob o comando do Facebook. O criador do Minecraft já pulou fora do barco após a notícia:
We were in talks about maybe bringing a version of Minecraft to Oculus. I just cancelled that deal. Facebook creeps me out.
— Markus Persson (@notch) 25 março 2014
Isso é provavelmente uma preocupação de curto prazo. Se o Facebook cumprir a promessa, os desenvolvedores vão perceber que o Oculus é o mesmo de sempre. A partir daí, não deve haver muita dificuldade em chamar atenção para o óculos de realidade virtual – especialmente porque esta é a melhor experiência de realidade virtual no mercado.
Para o longo prazo, no entanto, a pergunta é outra: como, exatamente, o Facebook planeja ganhar dinheiro com o Oculus? Zuck diz que não está interessado em lucrar com o hardware, mas diz que ele “pode ter propagandas”. No entanto, seria algo longe de um pop-up no meio do jogo: por exemplo, para que ir ao shopping quando você pode visitá-lo com o Rift, do conforto da sua casa?
O que nos leva à última pergunta sobre a parceria Facebook-Rift: que tipo de futuro as empresas esperam? Uma coisa é usá-lo para um jogo rápido. Outra é usar o Rift para assistir a uma palestra, pilotar um drone ou comandar um navio da marinha americana.
É também algo um pouco aterrorizante, justamente por nos remover do mundo em que estamos.
A realidade virtual pode nos deixar mais próximos de pessoas que estão a uma grande distância, mas nos desconecta do mundo em que estamos. Mas essas são questões para a sociedade em geral, não para o Facebook e Oculus. Hoje, a tecnologia mais incrível que já vi em anos acabou de receber os recursos para virar uma realidade mais ampla.
Colaborou: Felipe Ventura.