Cachorros de Chernobyl são alvo de pesquisa de sobrevivência em ambiente hostil
Um estudo com 302 cachorros que ainda moram em Chernobyl, na Ucrânia, palco do maior acidente nuclear da história, dá indícios de como a radiação pode afetar os mamíferos depois de anos de exposição.
Os animais vivem na chamada “zona de exclusão”, região que inclui a usina e os prédios da cidade ucraniana abandonada depois da explosão de 26 de abril de 1986. São, provavelmente, descendentes dos cães deixados para trás depois do acidente.
Segundo a pesquisa liderada por cientistas da Universidade da Carolina do Sul (EUA) e publicada na revista Science Advances na sexta-feira (3), os cachorros apresentam diferenças genéticas dependendo dos diferentes níveis de radiação aos quais foram expostos.
Os pesquisadores começaram a coletar amostras de sangue desses animais em 2017. Alguns deles vivem na usina – onde hoje os níveis de radiação estão normais. Outros estão a 15 km e 28 km de distância do local do acidente.
No começo, os pesquisadores acreditavam que os animais poderiam ter se misturado ao longo dos últimos 35 anos e, por isso, já teriam praticamente o mesmo DNA. Mas as análises mostraram o contrário: foi possível identificar quais cachorros viviam nas áreas de alto, médio e baixo risco de exposição.
“Foi um grande marco”, disse a geneticista Elaine Ostrander, do Instituto Nacional de Genoma Humano, uma das autoras da pesquisa. Segundo ela, o mais surpreendente é que foi possível identificar 15 famílias de animais.
Isso abriu caminho para avançar nas investigações: agora, os pesquisadores querem procurar quais são as alterações no DNA dos animais. “Podemos compará-los e dizer o que é diferente, o que mudou, o que evoluiu, o que ajuda e prejudica para a sobrevivência nesses locais”, explicou.
Pode ajudar humanos
Entender, através da genética, como os cachorros de Chernobyl conseguiram procriar e sobreviver em um ambiente insalubre pode ser a chave para ajudar humanos a viver em ambientes hostis e degradados, diz o estudo.
Simultaneamente, a pesquisa também pode mostrar como animais e seres humanos podem viver sob a ampla radiação que existe no espaço. Mas isso é um plano a longo prazo, uma vez que os estudos com cães da região ucraniana ainda estão em fase inicial.
Por enquanto, os cientistas seguem coletando amostras de sangue de cães em Chernobyl. E, desde já, eles relatam que os animais não perderam o gosto pela interação com humanos mesmo depois de três décadas quase que totalmente isolados.
“Mesmo sendo selvagens, eles ainda gostam muito da interação humana”, relatou Timothy Mousseau, outro autor do estudo, à Associated Press. “Especialmente quando há comida envolvida”.