Como é estar doente e em quarentena no epicentro do surto de coronavírus na Espanha

A cidade de Madri um dos epicentros do coronavírus na Espanha. Apesar da situação difícil, governo tenta amparar pessoas com seguro-desemprego.
Pessoas confinadas em suas casas aplaudem de suas janelas os trabalhadores de saúde que estão lidando com o surto de COVID-19, em Madri, em 28 de março. Crédito: Getty Images
Pessoas confinadas em suas casas aplaudem de suas janelas os trabalhadores de saúde que estão lidando com o surto de COVID-19, em Madri, em 28 de março. Crédito: Getty Images

Não conseguimos sair para rua desde 14 de março, quando o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, anunciou um estado de emergência e uma quarentena nacional por causa da epidemia de COVID-19. Mas todas as noites às 20h, as pessoas em toda Espanha vão às janelas, varandas ou terraços. O barulho começa suavemente, mas aumenta imediatamente e se estende por bairros e cidades. As pessoas estão aplaudindo os trabalhadores da saúde nos hospitais da Espanha, os trabalhadores de mercearias que continuam a encher as prateleiras de seus comércios, os caminhoneiros que fornecem comida e suprimentos, os farmacêuticos que abrem as drogarias. Enfim, todos que estão ajudando o país a passar pela pior crise pública de saúde de uma geração.

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Como muitos de vocês, nunca pensei que o surto de coronavírus chegaria onde eu moro. Sou do Texas (EUA), mas moro em Madri desde 2016. Apesar das manchetes assustadores da China e da Itália, tudo parecia normal nos últimos meses. Então, algumas semanas atrás, recebi um e-mail do meu chefe, enquanto eu estava me preparando para iniciar o trabalho, dizendo que começaríamos a trabalhar em casa imediatamente até que houvesse uma nova recomendação. Pouco depois, as autoridades espanholas começaram a pedir às pessoas que ficassem em casa para evitar a disseminação de COVID-19. Os hospitais estavam começando a ver mais e mais casos. Sim, o vírus chegou.

Comprei o equivalente a duas semanas de mantimentos e me tranquei no meu apartamento de 35 metros quadrados. Embora eu não estivesse preocupada em contrair COVID-19 — sou jovem, saudável, vou à academia três ou quatro vezes por semana — levei a sério as recomendações. Lavei minhas mãos com tanta frequência que elas começaram a rachar porque estavam muito secas e fiz um esforço hercúleo para não tocar meu rosto. Não foi o suficiente.

Doente e sozinha na quarentena

Era 15 de março, um dia após o bloqueio ordenado pelo governo, quando minha garganta começou a me incomodar. Parecia seca e doía um pouco. Algumas horas depois, meu peito começou a doer, como se houvesse muita pressão, e doía quando eu respirava. Como estava escrevendo tanto sobre o surto, estava familiarizada com os sintomas. Eu enviei uma mensagem para minha família nos EUA, dizendo que estava com medo, mas eles me disseram para não me preocupar. Provavelmente, é apenas ansiedade, me disseram, ou talvez seja gases.

Em 16 de março, acordei sentindo que tinha sido atropelada por um caminhão. Tive uma dor de cabeça latejante, dor de garganta, dores no corpo e não conseguia parar de suar, como se estivesse com febre. Enviei uma mensagem para dois amigos que eram médicos para ouvir seus conselhos. Uma delas trata pacientes de coronavírus em um hospital em Madri. Ela me disse que era possível que eu estivesse infectada.

Pessoa conferindo temperatura com termômetro. Crédito: Pexels
Febre é um dos sintomas de quem pode ter COVID-19. Crédito: Pexels

“Não fique com medo”, disse ela via WhatsApp. “Em jovens, geralmente, não há grandes problemas. Se a qualquer momento você sentir falta de ar, vá ao hospital.”

Falta de ar é considerado um sinal de alerta de emergência de COVID-19, segundo o CDC (Centros de Controle de Prevenção de Doenças dos EUA). Outros sinais de alerta incluem dificuldade de respirar, dor persistente ou pressão no peito. O CDC recomenda que pessoas com estes sintomas procurem atendimento médico imediatamente. No fim das contas, meus amigos disseram para eu tomar paracetamol a cada oito horas, descansar e não sair de casa em nenhuma circunstância.

Pelo menos tem um sistema de saúde público…

A ideia de que eu poderia ter COVID-19 era assustadora, mas uma coisa me confortou: estou na Espanha e, não importa minha situação, eu receberia tratamento e poderia fazer testes gratuitamente. Ao contrário dos EUA — onde os pacientes têm que pagar pelo tratamento — a Espanha possui um sistema público de saúde que oferece atendimento universal gratuito a todos. Isso inclui tratamento e hospitalização por COVID-19. O estado também concede licença remunerada a funcionários que pegarem a doença ou que tiveram que se isolar como medida preventiva. O governo paga a esses trabalhadores 75% de seu salário enquanto estão nessa situação.

O sistema público de saúde é mantido pelos impostos pagos no país. As pessoas também podem contratar um seguro saúde privado, que funciona junto com o sistema público e tipicamente custa entre 50 euros (cerca de R$ 287) e 200 euros (cerca de R$ 1.150) por mês, que serve para acessar tratamentos específicos mais rapidamente.

Em 17 de março, o terceiro dia, eu estava doente, liguei para a linha direta de coronavírus disponibilizada pelas autoridades locais de Madri para relatar meus sintomas. Inicialmente, eu não tinha certeza se alguém iria me responder. A mídia estava cheia de histórias de pessoas aguardando muito tempo e não recebendo uma resposta. Funcionários do governo alegaram corrigir esse problema contratando mais funcionários para atender os telefones. No meu caso, foi verdade. O operador anotou cordialmente meu número de identificação nacional e confirmou meu endereço antes de me perguntar sobre meus sintomas.

A primeira coisa que ela perguntou era se eu tinha febre, que é um dos sintomas mais comuns de COVID-19, juntamente com tosse e falta de ar. Infelizmente, não pude confirmar a febre porque não tinha termômetro em casa. No momento, não havia muitos termômetros nas farmácias de Madri, ou álcool em gel para as mãos ou máscaras faciais. Eu estava tentando comprar algum por dias, mas sem sucesso.

Então, disse à atendente que eu não sabia, mas eu imaginava que poderia ter tido febre, porque acordei suando. Parecia que estava queimando e com calafrios. Também disse a ela que vivia com uma dor de cabeça horrível por dois dias que não desapareceu com analgésicos, uma tosse leve e dor de garganta.

Pessoa lavando as mãos. Crédito: Pexels
Lavar as mãos é uma das principais ações para evitar a disseminação do novo coronavírus. Crédito: Pexels

Com base em tudo o que eu afirmei, ela disse que era provável que eu estivesse com febre. Ela então abriu um apontamento para mim e disse para não sair de casa, essencialmente me dizendo para ficar em quarentena. Ela acrescentou que a unidade de Serviços Médicos de Urgência Regional de Madri (SUMMA, em espanhol) me ligaria entre 24 horas e 48 horas para fazer o acompanhamento.

…mas que também comete erros

Tive uma dor de cabeça tão grande quando liguei que, honestamente, não me lembro se perguntei a ela sobre um teste de coronavírus, mas como ela me disse para ficar em casa, presumi que provavelmente não faria um. Naquela época, apenas pacientes graves estavam recebendo exames, que continuam em falta na Espanha. Nos últimos dias, o governo tentou obter testes mais rápidos. Eles compraram centenas de milhares de um fabricante chinês, mas depois teve que devolvê-los porque estavam dando resultados imprecisos.

Este foi um dos muitos erros do governo espanhol, que incluiu permitir que um dos vice-presidentes do governo, Pablo Iglesias, participasse de uma reunião de gabinete, mesmo que ele estivesse em quarentena porque sua esposa tinha COVID-19. Em outro exemplo, o governo inicialmente permitiu que os salões de beleza permanecessem abertos durante o bloqueio, antes de removê-los da lista de atividades permitidas. Em algumas ocasiões, essas ações estimularam os cidadãos a irem coletivamente para suas varandas, não para bater palmas, mas para bater em panelas e frigideiras para expressar sua desaprovação ao governo.

Ser um caso suspeito de coronavírus, embora não confirmado, significava que eu tinha ainda mais restrições do que o resto das pessoas da Espanha. Sob as atuais medidas de quarentena, os indivíduos só podem deixar suas casas para realizar determinadas tarefas. Isso incluir comprar alimentos e remédios, ir trabalhar se não puderem fazer home office, visitar centros de saúde, ajudar idosos e necessitados, ir a instituições financeiras ou sair de casa devido a circunstâncias extremas e imprevistas.

Todas as atividades acima devem ser realizadas isoladamente, embora a lei permita que pessoas com deficiência ou outras razões justificadas sejam acompanhadas.

No entanto, não poderia fazer nada disso porque estava doente. Mesmo que não fosse COVID-19, não poderia ter certeza sem um teste e não queria arriscar e deixar mais alguém doente. Considerando que moro sozinha e sair seria complicado, devo confessar que não estava muito preocupado com isso. Afinal, eu tinha pelo menos duas semanas de comida na minha geladeira.

Pessoa passando álcool em gel na mão. Crédito: Pexels
Álcool em gel é uma boa arma para limpeza das mãos, quando não há água e sabão por perto. Crédito: Pexels

Como eu estava fraca demais para fazer outra coisa senão ir do meu sofá para a cama e preparar pelo menos duas refeições por dia (durante todo esse período, simplesmente não estava com fome), fiz o que todos na Espanha estavam fazendo: assistia ao noticiário e lia notícias. De certa forma, isso era bom e ruim. Me senti melhor sabendo que estava acontecendo na Espanha e no mundo, mas, além de falar sobre a pandemia de COVID-19, a única coisa que as pessoas estavam falando era das preocupações com a economia.

A assistência do governo aos desempregados

Ler sobre o aumento vertiginoso de desemprego, não apenas na Espanha, mas em todo o mundo, não foi a coisa mais fácil de ouvir enquanto eu me sentia um zumbi. No entanto, fiquei consolada pelo fato de a Espanha estar tomando medidas para ajudar os trabalhadores cujas empresas provavelmente seriam afetadas pela crise, inclusive a minha, e também para reforçar o sistema de saúde para responder ao aumento de casos.

Como parte de uma ajuda econômica de 200 bilhões de euros, o estado pagaria aos trabalhadores 70% do salário-base regulamentado durante os primeiros seis meses e 50% de base após este prazo. Honestamente, isso não é muito — os trabalhadores em licença receberão em média 860 euros (quase R$ 5.000) por mês no início, mas já é algo. Colocando em contexto, o custo de vida em Madri é mais barato que em Nova York. Então, com este dinheiro eu conseguiria pagar meu aluguel e bancar minhas necessidades básicas por um tempo. (Como só escrevo para o Gizmodo nos EUA nos fins de semana, tenho outro trabalho principal durante a semana na Espanha.)

Outras medidas incluíram a proibição de empresas de energia, gás natural e água de interromperem os serviços em abril para indivíduos e pessoas vulneráveis que viram sua renda mensal cair devido à crise, além de emitir uma moratória aos pagamentos de hipotecas.

A Espanha também estava intensificando o sistema de saúde público. Logo após o país declarar estado de emergência, anunciou que contrataria 50 mil médicos, incluindo médicos residentes, médicos aposentados e estudantes de medicina em seu último ano de faculdade. Também permitiu que os governos regionais usassem recursos do setor de saúde privado, como serviços, equipamentos e hospitais, para tratar pacientes com coronavírus.

Cinco dias depois de eu ficar doente, ainda me sentia mal, mas não estava sentindo sérios sintomas de COVID-19. Na verdade, senti como se estivesse com uma gripe desagradável. Depois de não receber retorno dos serviços de emergência de Madri por 48 horas, em 19 de março, liguei de volta para o número fornecido pelo governo local. Uma operadora confirmou que meu caso ainda estava em aberto e me disse para continuar aguardando uma ligação. A unidade de serviços de emergência estava inundada, disse ela.

Isso significava que eu ainda não seria examinada. Eu ainda não tinha ideia se eu estava gripada ou com COVID-19. E embora eu não estivesse brava porque sabia que havia pessoas piores que eu, comecei a ficar preocupada.

Desde o primeiro dia que me senti mal, rezei para não ter falta de ar, assim não precisaria ir ao hospital. A região de Madri se tornou um epicentro do surto de coronavírus na Espanha. Os hospitais estavam sobrecarregados e o número de mortos aumentava diariamente. Até o momento, a região responde por 27.509 dos 94.417 casos confirmados no país, mais do que qualquer outra região. As mortes em Madri (3.603) representam 43% do total do país (8.189). A Espanha tem o terceiro maior número de casos de COVID-19. Só é superada pela Itália (101.739) e pelos EUA (165.874).

Monitor de casos de coronavírus da Johns Hopkins University
Espanha só fica atrás dos EUA e da Itália em número de casos do novo coronavírus

Além disso, a maioria das histórias que eu li ou ouvi na TV falava sobre a falta de equipamentos de proteção individual em hospitais, o que infelizmente é um problema comum em muitos países com surto de coronavírus. Com base nisso, não queria ir a um hospital, embora soubesse que precisaria se começasse a ter problemas para respirar. Todo novo dia era um alívio, mas também outro dia para começar a me preocupar com a respiração novamente.

Em 20 de março, comecei a me sentir um pouco melhor. Foi o meu sexto dia de doença, e o começo do que esperava ser minha recuperação. Minhas pernas doíam por não me mover por tanto tempo, então eu decidi andar pela área comum do prédio em círculos para tentar me mexer um pouco. Isso me fez sentir quase normal, como se eu pudesse andar pelas ruas da cidade. O ar estava fresco e minhas pernas estavam formigando. Comecei a respirar fundo, ansioso para me assegurar de que meus pulmões estavam bons e que eu ficaria bom.

Nos dias seguintes, agora com a mente mais cara e um corpo mais forte, comecei a pensar no que eu aprendi ao ficar doente com o que poderia ser o coronavírus. Foi horrível, mas as pessoas também estavam fazendo coisas maravilhosas.

Longe sim, sozinha nunca

Por um lado, as pessoas estavam muito dispostas a apoiar seus entes queridos durante a crise. Mesmo estando separada por distância e paredes dos meus amigos em Madri e pelo Oceano Atlântico da minha família e amigos nos EUA, nunca me senti sozinha. E sempre senti que tinha ajuda ao meu alcance.

Isso ficou imediatamente aparente quando comecei a contar lentamente ao meu círculo de amigos na Espanha que estava doente. Eles imediatamente começaram a verificar me estado todos os dias via WhatsApp ou chamada por vídeo. Se eu não respondesse, o que geralmente acontecia quando eu estava dormindo, eles me ligavam para garantir, em suas palavras, que não estava “inconsciente em algum lugar”. Um grupo de amigos, que considero minha família adotiva, até me disse para não me preocupar com compras, e que eles iriam ao mercado e deixariam os itens em minha porta.

Em 21 de março, tive um dia ruim. Não conseguir pensar direito e perdi o fôlego andando dentro da minha própria casa. Olhei-me no espelho do banheiro e vi que meu rosto estava pálido e que parecia pior do que dias atrás. Por alguma razão, foi preciso mais esforço para respirar naquele dia. Quando contei a um dos meus familiares adotivos como estava me sentindo, ela imediatamente me ligou e disse que dormia com o telefone ao lado dela, caso eu piorasse e precisasse ligar para ela.

Além disso, durante a primeira semana, uma das minhas amigas médicas, que estava lidando com pacientes do coronavírus em um hospital regional de Madri, arranjou tempo para me enviar mensagens de texto várias vezes para perguntar como eu estava e como estava me sentindo, além de responder algumas dúvidas minhas. Em 22 de março, disse a ela que havia perdido o fôlego no dia anterior, mas que me senti melhor. Ela me mandou uma mensagem rapidamente, dizendo-me para avisar se isso acontecesse novamente.

“Eles me deixam sair. Pegarei uma máscara e algumas luvas e irei até aí verificar como você está”, escreveu ela. “Se você perder o fôlego novamente, eu irei. Por favor, me diga.”

A outra grande coisa que surgiu da crise foi a inabalável solidariedade de pessoas em toda a Espanha. Ninguém quer que lhe digam que você precisa ficar em casa, e isso é ainda pior para os espanhóis, que são vibrantes e sociais, como meus anos aqui me ensinaram. No entanto, a maioria do público entende inequivocamente que eles precisam fazer um sacrifício e ficar em casa. Eles fazem isso para ajudar a conter esta doença, impedir que o sistema de saúde entre em colapso e para proteger os idosos e mais vulneráveis. Todo mundo entende a seriedade da coisa.

De certa forma, parece que achatar a curva de infecção é uma missão compartilhada na qual todos estão trabalhando. Alguns já organizaram festivais de música online no Instagram com artistas tocando e cantando em suas casas para entreter as pessoas durante o bloqueio. Outros estão ajudando as pessoas a se exercitarem em casa, como este instrutor em um complexo de apartamentos em Sevilha. Em Palma de Maiorca, a polícia foi fazer uma serenata em um bairro com um violão na rua.

A crise do COVID-19 também incentivou as pessoas a pensarem menos em si e mais em como podem ajudar os outros. Onde eu moro, os vizinhos do primeiro andar colocaram um aviso oferecendo ajuda para ir à farmácia ou ao supermercado para os idosos em nosso prédio. As pessoas também começaram a fazer máscaras em casa para doar à polícia e outras pessoas.

No hospital provisório de Madri, no centro de convenções de Ifema, 50 voluntários, entre trabalhadores autônomos e pessoas demitidas, ajudaram a instalar o sistema de suprimento de oxigênio. O que não falta é histórias desse tipo na Espanha, de pessoas fazendo o possível para ajudar os outros, dadas as circunstâncias. Isso muitas vezes me fez chorar.

Enquanto escrevo isso, em 27 de março, estou doente há quase duas semanas, mas fico feliz em dizer que me sinto melhor. Estou menos cansada e não sinto febre ou calafrios. Me sinto quase normal novamente. Durante essas duas semanas, o governo espanhol estendeu o estado de emergência e quarentena até 11 de abril e também ordenou que pessoas em trabalhadores fiquem em casa, se puderem. Também anunciou recentemente novas medidas que proíbem despejos de pessoas vulneráveis por seis meses, disponibilizaram empréstimos estatais com juros de 0% para pessoas que não podem pagar seu aluguel por causa da crise e permitem que trabalhadores domésticos recebam benefícios de desemprego, entre outras medidas.

Até o momento, não fui testada para COVID-19 e um representante dos serviços de emergência ainda não me ligou.

Nem tudo foi perfeito. Por exemplo, tentar obter mantimentos entregues durante a quarentena não foi uma tarefa fácil. Todos os serviços de entrega estavam fechados e levava dias para as entregas chegarem. Não era como se eu pudesse ir à loja comprar comida (embora eu finalmente tenha recebido uma entrega). Eu também tinha um grande problema para jogar fora meu lixo, que coloquei em um canto da área comum do prédio. O lixo de pessoas doentes deveria ser jogado fora nas lixeiras regulares, mas eu não posso sair. Então, o que eu deveria fazer? Ainda estou pensando em como resolver isso, enquanto as sacolas de lixo de casa vão enchendo.

Se a Espanha está assim, imagine os Estados Unidos

Apesar disso, não tenho dúvidas de que sou uma dos sortudas dessa luta global. Não tive que me preocupar com o acesso a cuidados médicos ou não ter renda durante essa crise. E também vi os incríveis atos de solidariedade e bondade de que a humanidade é capaz. A Espanha é meu segundo país e, embora esteja longe de ser um local perfeito, — o governo, sem dúvida, cometeu muitos erros ao lidar com a crise e o país ainda enfrenta enormes desafios — está lutando com tudo o que tem.

No entanto, sou cidadã dos Estados Unidos e amo meu país e meu povo. Dito isto, a resposta à crise nos EUA é preocupante e me faz temer pela segurança dos meus entes queridos. É o que estou vendo do outro lado do Atlântico.

Ao contrário da Espanha, nos EUA não existe um “lockdown” (bloqueio total) e nenhuma garantia de que haverá tratamento para os infectados com o coronavírus. Apenas alguns dias atrás, vi pessoas em Austin, no Texas, onde estudei, se reunirem na piscina Barton Springs e se sentaram um ao lado do outro sem se importar com medidas de distanciamento social. Pouco depois, o país registrou a primeira morte de um adolescente na Califórnia, aos 17 anos de idade, devido a complicações com COVID-19. Inicialmente, ele foi recusado porque não tinha plano de saúde.

Há muitas coisas que podem e devem ser feitas durante esta crise, e as medidas variam, sem dúvida, para cada país. Embora não possamos controlar o que nossos governos decidem fazer para enfrentar esta situação, há uma coisa que todos podemos fazer para ajudar, não importando onde esteja: fique em casa. Sei que para muitos será um grande sacrifício e que algumas pessoas podem ter circunstâncias que não lhes permitem fazer isso, mas é extremamente importante.

Digo isso porque amo os Estados Unidos e porque não quero centenas de milhares de mortos. Para evitar isso, a Espanha me ensinou que é importante que todos façam sua parte. É a única maneira de proteger os outros e a única maneira de garantir que poderemos abraçar nossos entes queridos novamente depois que isso acabar.

Quanto à Espanha, estamos segurando as pontas. Entendemos que é uma luta em que todos nós participamos, e não vamos desistir. Ficaremos dentro de casa o tempo que for necessário, e saímos na sacada para compartilhar um tempo juntos, às 20h. O barulho começa suavemente e depois ressoará por todo país, como sempre acontece.

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