“Lobo alfa” não existe na vida real dos animais, mostram estudos
Esqueça o conceito de “lobo alfa” como “macho dominante”: esta já é uma visão ultrapassada na ciência. Pesquisadores que se dedicam ao estudo de matilhas afirmam que a luta pelo domínio do grupo simplesmente não existe — e que esse conceito não passa de mito.
O termo caiu em desuso no meio científico desde 1999, quando um estudo publicado na revista Canadian Journal of Zoology mostrou que todos os membros do bando se submetem ao casal reprodutor, independente de sexo ou idade.
De modo geral, uma matilha de lobos selvagens é composta por um macho reprodutor, uma fêmea reprodutora e seus filhotes de dois ou três anos que ainda não se estabeleceram por conta própria.
Essas famílias costumam ter de seis a dez indivíduos, e os duelos pela supremacia são raros. Os filhotes mais novos também se submetem aos irmãos mais velhos. Quando a comida é escassa, os pais alimentam os filhotes primeiro – assim como fazem os humanos com seus bebês.
“Qual seria o valor de chamar um pai humano de macho alfa?”, comparou L. David Mech, pesquisador do US Geological Survey, que liderou o estudo, à Scientific American. “Ele é apenas o pai da família. É exatamente assim com os lobos”.
Em matilhas de lobos cinzentos, a luta pelo domínio do grupo simplesmente não existe. Quando os filhotes chegam aos três anos, eles deixam a família em busca de parceiros. “A noção do lobo alfa de desafiar o pai pelo domínio da matilha existente simplesmente não está no manual do lobo”, pontuou Mech.
De onde vem “lobo alfa”, então?
Apesar da origem não ser 100% clara, o termo foi usado com frequência por cientistas ao longo da história. O próprio Mech lançou um livro em 1970 com “lobo alfa” no título (“The Wolf: Ecology and Behavior of an Endangered Species”, sem edição em português”). Em 2003, porém, ele editou a obra e retirou o termo.
Mas a concepção de lobo alfa – e de “macho alfa”, por consequência – pode ter surgido da observação desses animais em cativeiro. Quando humanos reúnem lobos adultos sem parentesco compartilhado surge uma hierarquia de domínio.
Os animais vivem um processo parecido do que acontece em uma prisão humana, o que está bem longe do comportamento desses animais em ambientes sem qualquer interferência.
Caso de competição
Também é possível haver competição quando as matilhas aumentam de tamanho além do esperado. Nesses casos, os lobos jovens ficam com a família porque há comida para todos e a dispersão pode ser perigosa. A maior matilha que se tem registro reuniu 37 animais em 2001 no Parque de Yellowstone, nos EUA.
Nesses casos, pode haver mais de um casal reprodutor e a competição pode irromper pelos locais de reprodução. Se isso acontecer, o termo “alfa” se aplica porque há uma fêmea dominante dando ordens naquele bando. Sim, uma fêmea. Normalmente, a segunda fêmea reprodutora é filha da primeira.
Mas os lobos raramente cruzam com indivíduos da mesma família, exceto aqueles em populações pequenas e isoladas. Também é raro que existam vários pares reprodutores em uma matilha.
Os cientistas ainda não responderam a todas as dúvidas sobre os lobos e suas complexas organizações sociais. Mas uma coisa já está clara: o conceito de lobo alfa e seu uso para justificar a dominância dos machos (nas matilhas e nas sociedades humanas) já ficou para trás.