Pesquisa sugere que mudanças climáticas levaram à pandemia; mas há controvérsias

Estudo sugere que mudanças climáticas aumentaram as espécies de morcegos na China e as chances de uma doença ser transmitida aos humanos.
Crédito: Silvia Izquierdo (AP)

As mudanças climáticas estão basicamente bagunçando tudo em nossas vidas. É tentador encontrar uma maneira de associá-las à pandemia de coronavírus, e um novo estudo divulgado na sexta-feira (5) faz exatamente isso, afirmando que as mudanças climáticas “podem ter impulsionado o surgimento” do coronavírus. Mas isso pode ser mais complicado do que parece.

Os cientistas já sabem há algum tempo que as alterações no habitat, incluindo aquelas causadas pelas mudanças climáticas, podem fazer com que os humanos tenham um contato mais próximo com animais selvagens que podem carregar vírus perigosos. O novo estudo, divulgado na sexta-feira (5) na Science of the Total Environment, examina com mais detalhes como as mudanças climáticas podem ter alterado a composição dos habitats dos morcegos. As transformações nos ecossistemas ao longo da fronteira entre a China e Laos, diz o estudo, aumentaram o número de espécies de morcegos que vivem lá e as chances de uma doença ser transmitida aos humanos.

“Entender como a distribuição global de espécies de morcegos mudou como resultado das mudanças climáticas pode ser um passo importante na reconstrução da origem do surto de Covid-19”, disse o autor principal Robert Beyer, pesquisador do departamento de zoologia da Universidade de Cambridge, em um comunicado à imprensa.

Alguns animais selvagens são transmissores comuns de doenças que podem ser prejudiciais aos humanos, como coronavírus, ebola e raiva. Os morcegos, em particular, parecem ser um sinal de alerta para os humanos quando se trata de vírus: esses animais carregam cerca de 3.000 tipos diferentes de coronavírus, e pesquisas mostraram que há uma correlação positiva entre o número de tipos de espécies de morcegos que vivem em uma determinada área e a transmissão de doenças de morcegos para humanos.

Provavelmente, essa não é uma característica maligna exclusiva dos morcegos: pesquisadores descobriram que quanto mais espécies um grupo de animais tem, mais vírus diferentes eles podem hospedar. E, no caso, os morcegos têm muitas espécies diferentes.

As mudanças climáticas alteraram os ecossistemas em todo o mundo, à medida que o aumento das temperaturas e a mudança dos padrões de precipitação criam diferentes conjuntos de plantas e animais. O que era uma floresta tropical exuberante em 1800, agora pode estar repleta de tipos muito diferentes de flora e fauna. Esse é o caso, diz o estudo, de florestas no sul da China e ao longo da fronteira com Mianmar e Laos.

Os pesquisadores criaram um mapa de como a vegetação do mundo pode ter sido 100 anos atrás usando registros de temperatura, precipitação e cobertura de nuvens, e preencheram este mapa com as necessidades de habitat de diferentes espécies de morcegos. Eles então compararam essas informações com a vegetação atual e os dados sobre as populações de morcegos, concluindo que as mudanças no habitat podem ter levado cerca de 40 espécies diferentes a migrar para a área ao longo da fronteira entre a China e Laos.

Cada morcego carrega, em média, 2,7 tipos diferentes de coronavírus, diz o estudo. A pesquisa continua postulando que quando essas 40 espécies migraram para além de seu habitat original nos últimos 100 anos, eles totalizaram cerca de 100 versões diferentes de coronavírus, aumentando a chance de infecção entre espécies.

Essa teoria é interessante. Está claro que a crise climática está tendo um impacto massivo no mundo. E parece uma explicação bastante direta de como nosso planeta em aquecimento pode ter deslocado um vírus mortal para mais perto do contato humano. Mas só porque parece simples, isso não significa que é totalmente correto.

“É inegável que as mudanças globais, incluindo mudanças climáticas, alterações no uso da terra e mudanças demográficas, afetarão o risco emergente de patógenos”, disse Rachel Baker, pesquisadora do Instituto Ambiental da Universidade de Princeton que não estava envolvida no estudo, por e-mail. “ No entanto, encontrar uma relação causal entre essas mudanças e o surgimento de um patógeno específico, como SARS-CoV-2, é uma coisa complicada de se fazer.”

Ela observou que, embora as mudanças climáticas possam tornar os eventos como furacões ou incêndios florestais mais comuns ou extremos, não é a única coisa que os causa. Assim é com o vírus. Relacioná-lo às mudanças climáticas “é muito mais difícil de fazer com surgimento viral, já que você tem que levar em conta muitos outros fatores.”

Baker apontou que o estudo também não apresenta explicações claras sobre como exatamente mais espécies de morcegos em uma área realmente afetam a transmissão de doenças de morcegos para humanos. A metodologia não utilizou quaisquer observações de campo específicas sobre populações de morcegos, apenas dados de habitat e distribuição de espécies. Isso significa que falta uma peça-chave do quebra-cabeça científico que é necessária para apoiar suas fortes alegações.

“Embora as mudanças climáticas sejam uma peça do quebra-cabeça, houve muitas mudanças na sociedade humana nos últimos 100 anos que provavelmente aumentaram o risco de patógenos emergentes”, disse Baker.

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