Robert Gordon, o preservador do rock’n’roll pioneiro

Cantor americano morreu de um raro tipo de leucemia neste 18 de setembro aos 75 anos, depois de quatro décadas mantendo vivo o rock dos anos 1950 sem ligar para o mercado
Robert Gordon, o preservador do rock'n'roll pioneiro
Robert Gordon teve uma carreira comercialmente discreta para manter vivo o espírito dos anos 50 - Imagem: Wikipedia Commons

Pense no estilo de música que você mais gosta. Ele pode estar fora de moda em pouco tempo e jogado na lata de lixo do mercado fonográfico. O que você vai fazer então, deixar de gostar? Esse estilo vai deixar de ser bom?

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Um representante da paixão por um gênero específico foi o cantor americano Robert Gordon, que morreu aos 75 anos na terça, 18 de outubro, de um tipo raro de leucemia. Por quatro décadas, ele se dedicou totalmente a uma carreira comercialmente discreta para manter vivo o espírito do rock’n’roll inicial dos anos 1950.

Nascido no estado de Maryland, no leste dos EUA, Robert tinha 9 anos quando foi hipnotizado por Elvis Presley cantando “Heartbreak Hotel”. Avançou querendo saber tudo sobre o Rei do Rock e contemporâneos dele. Na adolescência, ignorou Beatles, Rolling Stones e a onda hippie do fim dos anos 1960. O que ele gostava era de rock’n’roll pioneiro.

Capa do álbum que traz a dobradinha entre Robert Gordon e Chris Spedding, contendo 30 músicas resgantando as raízes do rock and roll.

Capa do álbum que traz a dobradinha entre Robert Gordon e Chris Spedding: 30 músicas com as raízes do rock’n’roll

Nos anos 1970, Robert foi morar em Nova York e se enfiou no cenário musical alternativo. Com uma voz diferente, capaz de trabalhar nos graves, entrou para a banda Tuff Darts. Ali foi descoberto pelo jovem mas já veterano produtor Richard Gottehrer.

Gottehrer já tinha produzido sucessos nos anos 1960 e foi co-fundador do selo independente Sire, para o qual contratou Ramones e Talking Heads. Também descobriu e produziu Blondie, The Go-Go’s e Madonna.

Concerto mítico de Robert Gordon com um dos melhores guitarristas das décadas de 1950-1960, Link Wray

Concerto mítico de Robert Gordon com um dos melhores guitarristas das décadas de 1950-1960, Link Wray

Esse ouvido de ouro se encantou com o barítono que Robert trazia na garganta e pelo seu apreço ao rock dos primeiros anos. Gottehrer convenceu Gordon a iniciar uma carreira solo cantando o que amava. E conseguiu que seu guitarrista-parceiro fosse o Link Wray.

Link Wray era uma lenda marginalizada em 1977. Foi revolucionário em 1958 ao furar os alto-falantes de seu amplificador para obter uma distorção que ninguém tinha e gravar o instrumental “Rumble”, um hino de puxar briga.

Lançado em 1980, albúm recicla pérolas de três décadas antes, além de nos brindar com sua própria criação "Born to Lose".

Lançado em 1980, Gordon recicla pérolas de três décadas antes, além de nos brindar com “Born to Lose”

Wray influenciou de Bob Dylan a Jimmy Page, o guitarrista do Led Zeppelin. Vale ver a felicidade de Page ao botar o compacto de “Rumble” em sua casa e curtir a ponto de tocar “air guitar” numa cena do documentário “It Might Get Loud”.

Voltemos a Gordon. O primeiro LP, com Robert como artista principal, saiu em 1977. Outro sairia em 1978. O grosso do material era de releituras de rocks dos anos 1950, mais algumas inéditas aqui e ali.

Para o álbum de 1978, Bruce Springsteen, outro amante do rock, deu a música “Fire” para que a dobradinha Gordon-Wray gravasse em primeira mão. Uma versão que ficou magnífica. O próprio Bruce só lançaria “Fire” em 1986, numa gravação ao vivo feita naquele mesmo ano de 1978.

Penúltimo álbum de Gordon, e o primeiro novo álbum desde meados dos anos 2000, incluindo 12 faixas recém-gravadas.

Penúltimo álbum de Gordon, e o primeiro novo desde meados dos anos 2000, incluindo 12 faixas recém-gravadas

A parceria com Link Wray ainda rendeu um álbum ao vivo antes de acabar. Em seguida, Robert Gordon se uniu ao guitarrista de estúdio Chris Spedding, que produziu as fitas demo dos Sex Pistols em 1976 e viria a trabalhar até com Paul McCartney.

Na entrada dos anos 1980, Gordon prosseguiu com seus álbuns de covers e alguns originais, e se beneficiou de uma onda de neo-rockabilly (forte no Reino Unido, mesmo com artistas americanos) reforçada por bandas como Stray Cats e The Cramps.

A onda logo passou. E Robert Gordon passou de 1981 até 1994 sem gravar um álbum de estúdio. Retornou com a voz solene de sempre, fazendo uma versão imponente de “These Boots Are Made for Walkin”’, clássico de 1966 de Nancy Sinatra, filha do Frank.

Último álbum celebrou as raízes do rockabilly e teve a participação de uma série de convidados, como James Williamson, Chris Spedding, Steve Wariner, Letterman, Joe Louis Walker, Clem Burke, Kathy Valentine, entre outros.

Último álbum teve a participação de James Williamson, Chris Spedding, Steve Wariner, Clem Burke, entre outros

Mesmo sem discos novos, Robert Gordon seguiu fazendo shows em comunhão com outros apreciadores do rock pioneiro que formavam a plateia. Em 2020, lançou seu último álbum em vida, “Rockabilly for Life”.

Ele iria fazer shows com velhos amigos no último verão americano, mas cancelou por causa da saúde. Mesmo assim, deixou pronto um último álbum, “Hellafied”, novamente em colaboração com o velho amigo Chris Spedding. O lançamento está previsto para 25 de novembro pela independente Cleopatra Records. Foi até o fim no que gostava.

Marcelo Orozco

Marcelo Orozco

Jornalista que adora música, cultura pop, livros e futebol. Passou por Notícias Populares, TV Globo, Conrad Editora, UOL e revista VIP. Colaborou com outros veículos impressos e da web. Publicou o livro "Kurt Cobain: Fragmentos de uma Autobiografia" (Conrad, 2002).

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